CAROLINA LINHARES, JOSÉ MARQUES E AVENER PRADO, ENVIADOS ESPECIAIS MARIANA, MG (FOLHAPRESS) – A mineradora Samarco defende que medidas reparatórias que tomou após sua lama de rejeitos destruir 650 km de ecossistemas, inclusive um acordo com o governo federal, justificam a absolvição da empresa por parte dos crimes ambientais aos quais responde em ação penal.

O argumento foi usado pelos advogados à Justiça Federal em Ponte Nova (MG), onde tramita o processo criminal contra a Samarco e suas donas, Vale e BHP Billiton. Elas respondem, juntas, por 12 crimes ambientais.

Dois anos depois do rompimento da barragem de Fundão, obras de urgência para diminuir o desastre ainda não foram terminadas, o mar de Linhares (ES) continua proibido para pesca, e famílias lutam para serem incluídas em programa de indenização.

Ao juiz Jacques de Queiroz Ferreira, contudo, a Samarco diz que tomou providências que a eximam da acusação de crimes de administração ambiental “”por, segundo a Procuradoria, ter omitido que a Vale também despejava lama em Fundão.

“É acertado dizer que as condutas prévias e posteriores [ao rompimento] desempenham papel relevante como critério para atribuição ou não de um sentido jurídico-penal de ação”, diz a defesa apresentada em juízo em março por três advogados, que classifica o rompimento como “acidente”. A reportagem teve acesso ao processo, que tem 45 volumes e quase 10 mil páginas.

Segundo a defesa, as medidas adotadas para mitigação e reparação dos danos ocorridos “apontam para a mais completa ausência de quaisquer critérios válidos de atribuição ou constatação de um sentido delitivo intrínseco aos crimes de administração ambiental”.

Essas ações sofreram sucessivos atrasos e questionamentos de órgãos como o Ministério Público e o Ibama. Entre as medidas adotadas, a Samarco cita o acordo com a União, que não é homologado pela Justiça, e a criação da Renova, fundação bancada pela empresa e suas donas para arcar com o ônus da reparação de áreas destruídas e pagamento de indenizações.

O processo está suspenso desde julho para investigar a possibilidade de a Polícia Federal ter ultrapassado o período autorizado para realizar escutas nos telefones de executivos da mineradora. No total, são rés no processo 22 pessoas (21 delas sob acusação de homicídio com dolo eventual, quando se assume o risco de matar) e quatro empresas -as mineradoras e a consultoria VogBR, que apresentou laudo de estabilidade da barragem. Todos negam ter cometido crimes.

Na defesa, a Samarco também tenta evitar que a empresa seja levada ao tribunal do júri, conforme requisitado pelos procuradores. A mineradora refuta ainda a acusação de crimes contra o patrimônio cultural, argumentando que igrejas, cemitério, mina e marcos da Estrada Real destruídos não eram tombados ou protegidos por normas específicas. Também acusados, dois membros da cúpula da Samarco, o ex-presidente Ricardo Vescovi e Kleber Terra, disseram que o Ministério Público Federal não conseguiu apontar condutas que os incriminassem como responsáveis pelo rompimento. A Vale também se exime de qualquer responsabilidade.

Procurada, a Samarco disse que não comentaria. Já a Vale “reitera que jamais foi a gestora da Barragem de Fundão, estrutura de propriedade e sob controle operacional próprio e exclusivo da empresa Samarco”.