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Com milhares de seguidores e cada vez mais visibilidade, influenciadores digitais se tornaram protagonistas na divulgação de conteúdos dos mais diversos temas. No entanto, junto com o alcance, vem também a responsabilidade jurídica por tudo o que é compartilhado online. Quando esse compromisso com a veracidade e legalidade é negligenciado, as consequências podem ser graves — e até criminais.

“A popularidade não serve de escudo contra a lei. A fama ou o número de seguidores não conferem imunidade. A percepção de impunidade é uma ilusão perigosa”, alerta o advogado criminalista Leonardo Fleischfresser, mestre em Ciências Jurídico-Criminais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Crimes virtuais, consequências reais

Entre as infrações mais comuns nas redes estão os crimes contra a honra — calúnia, injúria e difamação — que envolvem desde acusações falsas até comentários ofensivos direcionados a empresas ou indivíduos. Segundo o Código Penal, essas condutas podem ter penas agravadas quando cometidas em meios que ampliem sua divulgação, como as redes sociais.

Outra situação frequente é a publicidade enganosa ou abusiva. Embora muitas vezes tratada na esfera cível e administrativa, ela pode ultrapassar essa linha. “Se um influenciador promove conscientemente um produto falso ou fraudulento, pode responder criminalmente pela prática associada ao que divulga”, explica Fleischfresser.

A promoção de atividades ilegais, como apostas clandestinas, também representa um risco. Já houve casos de influenciadores presos por divulgar “fórmulas milagrosas” para enriquecer ou até por envolvimento com crimes mais graves, como tráfico de drogas e sequestro.

Lavagem de dinheiro e fake news

Um dos exemplos mais recentes foi a Operação JackPot, da Polícia Civil de Minas Gerais. Influenciadores foram presos após movimentarem grandes quantias de uma empresa investigada por crimes financeiros e usarem esses recursos para divulgar jogos ilegais. A acusação: lavagem de dinheiro.

“A lei é clara: não existe lavagem culposa. O influenciador precisa ter plena consciência de que está dissimulando a origem de recursos ilícitos. Se isso for comprovado, a pena pode variar de três a dez anos de reclusão”, afirma Fleischfresser.

No campo da desinformação, a responsabilização por fake news depende do contexto. Embora o Brasil ainda não tenha um tipo penal específico para a prática, divulgar informações sabidamente falsas pode configurar crimes como calúnia, estelionato, crime contra o consumidor ou contra a economia popular.

“A liberdade de expressão é protegida, mas isso não inclui discurso de ódio, mentiras deliberadas ou difamação. E mesmo sem contrato formal, empresas ou pessoas que se sentirem lesadas podem recorrer à Justiça”, destaca o especialista.

Empresas também podem ser responsabilizadas

Contratar um influenciador para divulgar produtos ou serviços exige cautela. Na esfera cível, a responsabilidade por publicidade enganosa é, em regra, solidária — ou seja, tanto a empresa quanto o influenciador podem ser responsabilizados.

“Se a empresa escolhe mal ou negligencia a supervisão do conteúdo, pode responder por culpa in eligendo (culpa na escolha) ou culpa in vigilando (falha na fiscalização)”, explica Fleischfresser.

Na esfera penal, a responsabilização direta da pessoa jurídica é restrita, em geral, aos crimes ambientais. No entanto, gestores podem ser punidos se comprovada a participação consciente em atos ilícitos promovidos pelos influenciadores.

Boas práticas para evitar riscos

Para mitigar riscos legais, o advogado recomenda às empresas algumas medidas preventivas:

  • Pesquisar a reputação do influenciador;
  • Avaliar o conteúdo e o perfil do público;
  • Estabelecer contratos detalhados, com cláusulas de responsabilidade e aprovação prévia;
  • Exigir conformidade com as normas do CONAR e a legislação vigente;
  • Monitorar de perto a execução das campanhas, sobretudo em temas sensíveis como finanças, saúde e apostas.

“A responsabilização criminal de influenciadores digitais é uma realidade crescente. Não basta ter seguidores — é preciso ter responsabilidade”, finaliza Fleischfresser.

Sobre o especialista

Leonardo Fleischfresser é advogado criminalista, professor universitário e mestre em Ciências Jurídico-Criminais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (Portugal). Também é Membro Pesquisador do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e Membro Relator da Comissão da Advocacia Criminal da OAB/PR.