O apreciável descompasso verificado entre a variação das vendas reais do comércio varejista e da produção industrial brasileira, apurado por pesquisas específicas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), atesta, inequivocamente, o peso assumido pela pronunciada ampliação dos mecanismos de crédito e da disponibilidade de produtos importados no suprimento da demanda doméstica brasileira.
De fato, de acordo com levantamentos da Confederação Nacional da Indústria (CNI), a participação dos bens industriais (de consumo e de produção) procedentes do exterior no consumo interno do País saltou de 12,5% em 1996 para 22,2% no ano terminado em julho de 2012. Ao mesmo tempo, a parcela da produção industrial destinada ao exterior vem exibindo rota cadente, passando de 20,4% em 2006 para 18,1% no exercício anual findo no mês de julho de 2012, sendo 72,3% para os ramos extrativos e 15,2% para as divisões de transformação.
A impulsão das compras internacionais e o enfraquecimento das exportações de produtos manufaturados traduzem, em linhas bastante gerais, a preferência política por um estilo de crescimento amparado, de um lado, no fortalecimento do mercado interno – particularmente dos componentes ligados à emprego formal, salário real (capitaneado pela valorização do mínimo), crédito e ações oficiais de transferência direta de renda – e, de outro, na linha ascendente dos termos de troca das matérias primas agrícolas, minerais e metálicas no cenário mundial.
No entanto, a compressão de ímpeto das exportações de manufaturas e a invasão generalizada  de importados refletem, além da concorrência desleal imposta sobretudo por algumas economias avançadas e outras emergentes, graves distorções associadas à competitividade sistêmica da matriz industrial brasileira, materializadas na contabilização de despesas diretas e indiretas de produção e distribuição substancialmente superiores aquelas experimentadas pelas nações concorrentes em um ambiente globalizado.
Na estrutura de custos, destaca-se os itens administrativos e burocráticos, as deficiências domésticas de algumas cadeias de fornecimento, a precariedade infraestrutural, a apreciável carga tributária e de juros e as pressões emanadas do fator trabalho e dos insumos, sobretudo os energéticos e aqueles com precificação internacional.
Mais precisamente, o contínuo vigor do mercado de trabalho, somado à indexação do salário mínimo e à insuficiência de mão-de-obra, especializada ou não, tem facilitado a obtenção de correções dos valores dos rendimentos salariais dos trabalhadores bastante acima da inflação, além da incorporação de outras vantagens monetárias como, por exemplo, a participação nos lucros e resultados. Cálculos do Banco Central (BC) revelam que o custo da mão-de-obra subiu quase 9,0% entre janeiro e maio de 2012 no Brasil, em confronto com o mesmo intervalo de 2011.
Na mesma balada, a apreciação das commodities na fronteira exógena tem se desdobrado na elevação dos preços das matérias primas industriais no mercado doméstico, fenômeno que pode se agravar com o recente curso de valorização do dólar, especialmente porque um número nada desprezível de firmas brasileiras de atuação global promoveram mudanças relevantes em suas cadeias de suprimento, privilegiando compras internacionais nos tempos de real mais fortalecido.
A subida conjunta dos dispêndios operacionais, em um panorama de expansão modesta do faturamento, por conta do enfraquecimento da demanda externa, da intensificação da concorrência imposta pelos produtos importados, da perda de embalo das transações no front doméstico e, consequentemente, da formação de barreiras ao costumeiro repasse aos preços, provocou compressão nas margens de rentabilidade das empresas.
Ressalte-se a influência do câmbio apreciado, dos escassos investimentos em ciência, tecnologia e inovação e a ausência de prioridade às áreas de educação fundamental e ensino profissionalizante, atestando tanto a fraca articulação entre as esferas públicas e privadas quanto a rigidez institucional na definição e tratamento de políticas estruturais.
Há também os diminutos ganhos de produtividade. A propósito, interessante simulação feita pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) mostra que esta variável vem crescendo no País em velocidade cerca de duas vezes inferior à das nações desenvolvidas ou em desenvolvimento. Conforme aquela instituição, a produtividade da economia brasileira teria observado incremento de 1,3% ao ano entre 1950 e 2009, o que a colocou no 11º posto em uma classificação planetária liderada por Japão (2,5% a.a.), China (2,3% a.a.), Estados Unidos (1,9% a.a.), Espanha (1,7% a.a.) e Coréia do Sul (1,7% a.a.).

Gilmar Mendes Lourenço, é economista, presidente do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), professor do Curso de Economia e Editor da revista Vitrine da Conjuntura da FAE e autor do livro Conjuntura Econômica: Modelo de Compreensão para Executivos. Foi eleito  O Economista Paranaense do Ano de 2011 pelo CORECON/PR e vencedor do Prêmio Imprensa e Quality TV & Jornais em novembro de 2011. Ele escreve às quartas-feiras neste espaço