Geraldo Bubniak – “Petraglia: mais um texto polu00eamico”

O presidente do Conselho Deliberativo do Atlético Paranaense, Mario Celso Petraglia, divulgou uma carta no site oficial do clube avisando que vai se afastar do departamento de futebol. No texto, ele defende o trabalho de Fernando Diniz, demitido no último domingo (dia 24) à noite. Para Petraglia, o treinador acabou demitido por pressão de parte da torcida, de sócios, de conselheiros e da diretoria do clube. 

“A pressão veio de todos os lados, todos com os últimos resultados debaixo do braço como a cristalina verdade que anunciava o fracasso do projeto. Análises da parte, não do todo, baseadas em medo, temor e vaidade, que vieram de torcedores, sócios, conselheiros e até de parte da diretoria administrativa, que numa reunião interna à revelia resolveu, por unanimidade, que seria a hora de mudar o planejamento inovador e partir para as velhas fórmulas e saídas conservadoras, com menores riscos”, afirmou Petraglia.

O texto também critica parte da imprensa. “O clima negativo tomou conta do cenário, a pressão tomou proporções insuportáveis, o desafio se tornou gigantesco e nenhum de nós estava disposto a enfrentar essa guerra passional e fomentada por uma mídia sem visão de futuro que não tem capacidade de ver muito além do último jogo”, escreveu o dirigente.

Veja o texto de Petraglia, na íntegra:

"CONSERVADORES

É fora do comum que em um terreno de extremo conservadorismo como é o futebol, o Atlético Paranaense tenha conseguido inovar tanto. Se tivéssemos tido medo de dar a cara à tapa lá no início, há 23 anos atrás, talvez ainda estivéssemos paralisados, presos à rivalidades locais que hoje são tão pouco significativas que não precisamos mais do que um time de aspirantes para prevalecer. Não houve nesse tempo todo uma só tentativa de trazer a modernidade que não tenha enfrentado fervorosa oposição, interna e externa. Mas conseguimos, fomos provando pouco a pouco que a inovação é o único caminho que temos para seguir, a única forma de fazer a diferença. Para se avançar tanto e em um tempo histórico tão pequeno, a desconfiança é o preço.
 
Vendo o que conseguimos, valeu a pena pagar para ver. O que temos hoje é a melhor infraestrutura para treinamento, para formação, o melhor e mais barato estádio do Brasil e um clube que deixou de ser a terceira força de um estado nulo representativamente para figurar hoje em 9º lugar no ranking de clubes nacionais, mesmo sendo apenas o 13º quando falamos de faturamento. Os oito clubes à frente de nós faturam três, quatro, cinco vezes mais.
 
É quase impossível subverter o status quo, a não ser surpreendendo. Sem orçamento que nos permita contratar os melhores jogadores e treinadores, temos que criar algo novo. Pois está claro que as condições são desiguais e que a ordem do futebol tende a perpetuar o que está estabelecido desde o século passado. A vinda do Fernando Diniz foi uma tentativa de fazer o diferente, de buscar um modo de atuar que fosse novo e próprio. Que nos fizesse depender menos dos mais caros profissionais do mercado e que colocasse a criatividade à serviço dos resultados. Assim poderíamos diminuir e ajustar essa lacuna.
 
Depois de inovar tanto na estrutura, inovar também na bola. Mas foi aí que enfrentamos as piores barreiras para pôr em prática esta iniciativa: o fanatismo e a paixão que cega até os atleticanos mais racionais. A pressão veio de todos os lados, todos com os últimos resultados debaixo do braço como a cristalina verdade que anunciava o fracasso do projeto. Análises da parte, não do todo, baseadas em medo, temor e vaidade, que vieram de torcedores, sócios, conselheiros e até de parte da diretoria administrativa, que numa reunião interna à revelia resolveu, por unanimidade, que seria a hora de mudar o planejamento inovador e partir para as velhas fórmulas e saídas conservadoras, com menores riscos.
 
Após conversa pessoal com o Fernando Diniz, em comum acordo, decidimos que seria o momento de descontinuarmos o planejado. O clima negativo tomou conta do cenário, a pressão tomou proporções insuportáveis, o desafio se tornou gigantesco e nenhum de nós estava disposto a enfrentar essa guerra passional e fomentada por uma mídia sem visão de futuro que não tem capacidade de ver muito além do último jogo.
 
O medo da mudança, o medo da vergonha, o medo do que os adversários vão falar, medo do que a mídia vai dizer, medo dos comentários em grupos fechados de whatsapp, medo, medo, medo. Não há nada que se possa fazer quando o medo domina a maioria, estabelece suas "verdades", absorve até os cérebros que pensávamos ser imunes à auto depreciação. No futebol, vence o de sempre. Com pesar, abandonamos este projeto de criar um jeito próprio de jogar, que não foi implantado sem base científica, estudos e respaldo técnico. Não era a hora de declinar desta proposta. Sabemos que iniciativas como esta levam um pouco mais de tempo para darem o retorno que esperamos. Há a necessidade da compreensão de várias partes envolvidas.
 
Se poderia dar certo? Não tenho dúvida que sim. Vimos este time, com esta mesma proposta, chegar a ter momentos brilhantes no início. Jogos que fomos muito bem, que nos fez ser tema de debates e que despertaram a curiosidade pelo simples fato de termos surpreendido a todos. Quem garante que com ajustes não poderíamos manter o planejado? Se chegamos a jogar tão bem por que não poderíamos corrigir e voltar à rota?
 
Mas tudo isso não foi em vão. Plantamos a semente, apresentamos um caminho e preparamos o terreno para a mudança que em breve vai varrer o "de sempre" do mapa. Como o meteoro para os dinossauros. O perfil dos novos torcedores mudou, o modelo de torcidas organizadas como exércitos beligerantes também não tem mais lugar, e o formato dos campeonatos vai mudar radicalmente com o novo Mundial de Clubes, com 24 times. O futebol se tornou uma atração global, campeonatos locais já não têm o menor apelo. Temos dito isso desde a primeira vez que jogamos o campeonato estadual com um time alternativo, já ha alguns anos. Qual foi a reação? Conflito, oposição e falta de compreensão do que está por vir. Se não inovarmos, vamos ficar de fora dos grandes eventos, que hoje com a tecnologia se tornaram dominantes e em escala global.
 
O trem bala está passando mais uma vez e não tivemos o apoio para subir à bordo. Espero que o Atlético Paranaense siga fazendo a transformação que esperamos também no futebol, se antecipando e sendo protagonista das mudanças. Temos que nos antecipar ao meteoro. Quem se negar a entender, vai virar fóssil.
 
Estou saindo das quatro linhas, mas ninguém pode dizer que me faltou coragem para propor o novo. Meu sentimento no momento é de tristeza, mas minha consciência nunca esteve tão tranquila, ciente de que fiz o que pude antes que sejamos engolidos pela mudança.
 
Espero, de coração, que o amor incondicional ao clube se torne maior do que a paixão cega e fanática. Assim, poderemos continuar evoluindo.
 
"É muito melhor arriscar coisas grandiosas, alcançar triunfos e glórias, mesmo expondo-se a derrota, do que formar fila com os pobres de espírito, que nem gozam muito nem sofrem muito, porque vivem nessa penumbra cinzenta que não conhece vitória nem derrota" – Theodore Roosevelt.
 
 
Mario Celso Petraglia
Presidente do Conselho Deliberativo"