Anna Júlia Santos – Rapper JuPat.

JuPat acaba de lançar seu primeiro disco, “Toda Mulher Nasce Chovendo”. Composto por 13 faixas autorais e completamente biográficas, trabalho, sobre o nascimento por meio da transformação de um estado físico para o outro, surgiu da necessidade que a artista tinha em entender-se como uma nova pessoa, registrando e recriando a si mesma.”Eu estava saindo de uma relação que havia durado 10 anos e, ao mesmo tempo, me apresentando como mulher para o mundo. Compor era um jeito de aliviar a existência que, naquele instante, me transbordava. Não tinha nenhuma pretensão, mas, hoje, percebo que produzi um registro de resistência. É uma busca beauvoiriana do que significa não nascer, mas, antes disso, se tornar mulher”, explica.

Produzido por Rasec, com alquimia final de Pipo Pegoraro, o álbum tem o peso do rap, as experimentações transcendentais do trip-hop e as divagações de um corpo netuniano em melancolia tropical. Entre as inspirações e influências musicais, nomes como Wu-Tang, Lovage, Quinto Andar, Dr. Octagon, Ave Sangria, Novos Baianos, Fabriccio, Lulu Santos, Djonga, Don L, Baco Exu do Blues, Flora Matos, Bivolt, Curumin e Edgar. ”Não consigo falar sobre tudo que ouço, amo e sou, sem querer escrever uma monografia”, brinca. Com “Introbiografia”, JuPat abre espaço para um manifesto que, com participação de Silvia Tape, questiona invisibilidades, amores, classificações e contradições de todas as vidas normais.

Entre colagens do filme Madame Satã e scratches de DJ Ciro, a segunda faixa, “Corpo Inabitável”, presta homenagem, em forma de grito, a muitas e muitas mulheres que, apesar de, seguem na luta e continuam de pé. “Maré Alta”, com poesia final de Stella Paterniani, reflete sobre um corpo, em alto mar, encarando verões e invernos. “A gente vai navegando, errando, calculando, desafinando, desalinhando, escapando e, sempre, mudando. Nada permanece igual”. Em seguida, “Paraísos Reais” e todos os seus universos paralelos, com diferentes padrões, conta com a colaboração de Plaq Max e Buda. Já no término, colagem de frases ditas, com extremo poder de representatividade, por Linn da Quebrada. “Na Primeira Noite”, que integra texto de Ge Ladera, faz um passeio pelo universo das composições particulares da cantora. “É aquele lance de estar descalça, ouvindo algum som em loops de eterno retorno, absorvendo referências e devolvendo mil freestyles de existência”.

Logo depois, toda a agonia envolvida na “Espera” de poder ser e estar. “Falo de quem se prepara para enfrentar a chuva, fazendo as malas, mudando de nome, fugindo de casa para não viver no quase”. “A Terra Quer Meu Corpo” é sobre o feminino e as relações sagradas com as entidades que estão entre as mulheres. “Amanhecer”, com scratches de DJ Ciro e participação especial de Shou, abre caminhos para “Transe”. “Nessa track, falo sobre transar com a morte, relacionar-se com o outro, viver com liberdade e experimentar a plenitude. É sobre entregar-se para o concreto, escrito na pele, e para aquilo que está escondido debaixo dos lençóis”. Para aquecendo os corações, “Blue Jeans 80”. “Costumo dizer que essa é uma lovesong sobre resgate de desejos adolescentes. Ela desvenda prazeres sem nome e vícios compartilhados para ressuscitar orgasmos antigos”. Rap nostálgico, “Quanto Tempo” celebra clichês, loucuras, fantasias e sonhos em faturas de cartão de crédito. Acompanhada pelo violão e gaita de Nivas, “A Última Noite” canta a aceitação. Finalizando, “O Circo”. “Fecho esse projeto com outra poesia de Denise Mokreys, minha parceira na vida. Quando iniciei meu processo de transição de gênero, ela esteve ao meu lado e, juntas, morremos e renascemos como novas pessoas. Ela é um girassol encerrando a chuva”. “Toda Mulher Nasce Chovendo” vem da água, da fluidez, da libertação emocional, do misticismo, do desejo de alcançar o divino. No fim, mais uma mulher nasceu. Ouça aqui: https://goo.gl/43eDcg