Franklin de Freitas – Ato na Justiça Federal: risco para investigações

Magistrados, procuradores, promotores e outros membros de carreiras de Estado promoveram nesta segunda-feira (19) um ato público em Curitiba, em repúdio à aprovação do PL 7596/17, que trata do abuso de autoridade. A manifestação ocorreu em frente ao prédio da Justiça Federal no bairro Ahú, onde são julgados os processos oriundos da operação Lava Jato do Ministério Público Federal no Paraná. Aprovado no último dia 14 pela Câmara Federal, o projeto aguarda agora manifestação do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que pode sancioná-lo ou vetá-lo total ou parcialmente. A Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas), formada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e outras entidades defendem que Bolsonaro vete trechos da lei, que segundo eles, “mantém definições de diversos crimes de maneira vaga, aberta, subjetiva”.

Em nota, a Frentas ressaltou que “as entidades trabalharão para que excessos e impropriedades contidos no referido projeto de lei sejam vetados e, em caso de sua sanção, para que os referidos artigos sejam invalidados pelo Poder Judiciário, diante de manifestas inconstitucionalidades”. Outros protestos estavam previstos para ocorrer em Brasilia, Recife, João Pessoa, Belo Horizonte, entre outros.

Crianças
A promotora da Infância Mariana Bazzo diz que na área dela a lei dificultaria abertura de diversas investigações. “Há muitas crianças que sofrem violência sexual, todos os dias, dentro de casa. Nós, do MP, temos serviços que trazem para a Justiça, para o Ministério Público, para a polícia, a informação dessas violências, como o Disque 100, por exemplo. Essas notícias, inclusive, não raramente, são anônimas”, explicou. “Não podemos deixar que haja risco de ser verdade que essa criança está sofrendo esse tipo de violência. Com essa lei vai existir uma dificuldade de se abrirem as investigações. Também incluo crimes contra mulheres que acontecem entre quatro paredes e que nós temos elementos às vezes menores, mas temos que iniciar pelo menos a investigação e em alta velocidade”, avalia. “Não é abuso, é simplesmente a possibilidade de iniciar investigações. Da maneira que a lei é escrita, é tão subjetivo, que traz o risco de alguém que for investigado processar o promotor e o policial por ter iniciado uma investigação”, argumenta.

Justa causa
Presidente da ANPR, o promotor André Glitz,, destaca um ponto da lei que ele considera especialmente prejudicial ao MP. “A Justa Causa Fundamentada. O promotor só pode oferecer uma denúncia criminal, só pode iniciar um processo civil, ou processo administrativo, tendo justa causa fundamentada. Essa expressão nós não sabemos sequer o conceito dela porque ela não existe”, disse. “Não sabemos o que é justa causa fundamentada. O que é prova suficiente para denunciar um traficante, para oferecer uma denúncia contra um traficante? A confissão? A apreensão da droga? Uma prova testemunhal? Nós não sabemos. Se o promotor oferece uma denúncia dessas e ao final o traficante vem a ser absolvido isso pode se voltar contra o promotor e ele ser responsabilizado por ter oferecido essa denúncia”, aponta.

Prerrogativas
Para o juiz Fernando Mendes, presidente da Associação dos Juízes Federais, um dos pontos mais sensíveis da lei é o que criminaliza a violação de prerrogativas de advogados. “O artigo nono, o artigo décimo, que tratam da quesão da justa causa, da ‘manifestamente’, que são termos muito abertos que podem gerar algum problema de interpretação”, afirma. “Outro ponto sensível é a questão da criminalização da violação dos advogados, é o artigo 43. Nos manifestamos contrários a essa criminalização por uma razão muito simples: o advogado tem direitos e prerrogativos e qualquer juiz que violar essas prerrogativas pode ser punido do ponto de vista administrativo e isso já existe de 1996 no estatuto da Ordem”, disse.

REPERCUSSÃO
‘Esperneio é válido’, ironiza relator
Relator da lei de abuso de autoridade na Câmara, o deputado federal paranaense Ricardo Barros (PP), ironizou ontem as manifestações de magistrados, procuradores, promotores de Justiça e agentes da área de segurança contra a proposta. “O texto é muito bom. Agora, o esperneio é válido. Sabemos como as coisas funcionam. Tenho certeza de que a Lei de Abuso de Autoridade coloca todos os brasileiros tendo que responder pelas suas ações”, defendeu ele em entrevista ao blog O Antagonista.

Segundo ele, o projeto não tem nada a ver com a Lava Jato. “A Lava Jato tem esta mania: tudo que não é de acordo com o pensamento deles, é um ataque à Lava Jato. Eu lamento”, disse. “A Lava Jato não é uma instituição, é uma força-tarefa dentro de uma instituição, mas ela pensa que está acima dos três Poderes da República. Isso precisa mudar, isso não é bom para o Brasil. Temos que acabar com esse ímpeto de paralisar tudo, de quebrar todas as empresas”, cobrou.

Barros atribuiu a reação contrária à lei ao corporativismo dos integrantes do Ministério Público Federal e outros órgãos. “Entendo a reação das corporações que se acham cerceadas no seu modus operandi, mas a lei não autoriza esses excessos que foram cometidos. Se estão agindo fora da lei, precisam ser enquadrados. Não há mais ninguém inimputável no Brasil”, defendeu.