BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Polícia Federal suspeita que os ataques de hackers em celulares de pessoas ligadas à Lava Jato tenham sido realizados de forma orquestrada, por um mesmo grupo. Embora as investigações ocorram de forma individual, a PF identificou um padrão nos casos em andamento.


Há até agora quatro inquéritos abertos para apurar as invasões, em Curitiba, Rio, Brasília e São Paulo, incluindo o que envolve o ministro de Justiça, Sergio Moro.


Os hackers tiveram acesso a um aplicativo específico de mensagens, o Telegram, e o fizeram depois da realização de telefonemas para o celular que seria alvo. Os primeiros relatos são de abril.


A suspeita é a de que os ataques tenham sido feito utilizando uma ferramenta que consegue roubar dados do usuário e, assim, acessar o aplicativo ao mesmo tempo que o próprio dono, sem precisar ter acesso físico aos aparelhos e sem precisar instalar programas espiões.


Seria, na verdade, uma espécie de clonagem, que se aproveita de brechas de segurança.


Pelo que foi apurado até agora, esse tipo de instrumento que pode ter sido usado no episódio das pessoas ligadas à Lava Jato seria de baixo custo, o que pode facilitar a comercialização e, portanto, mais ataques.


Casos desse tipo têm sido um desafio para a PF, que, muitas vezes, não consegue chegar nos autores.


Mensagens divulgadas no domingo (9) pelo site Intercept Brasil mostram que o ex-juiz Sérgio Moro e procurador Deltan Dallagnol trocavam colaborações quando integravam a força-tarefa da Lava Jato.


Os dois discutiam processos em andamento e comentavam pedidos feitos à Justiça pelo Ministério Público Federal.


Após a publicação das reportagens, a equipe de procuradores da operação divulgou nota chamando a revelação de mensagens de “ataque criminoso à Lava Jato”. Também em nota, Moro negou que haja no material revelado “qualquer anormalidade ou direcionamento” da sua atuação como juiz.


Neste domingo (9), o si­te The In­ter­cept Brasil disse ter acesso, por meio de uma fonte anônima, a mensagens trocadas por Moro, quando ainda era juiz federal, e procuradores do Ministério Público Federal, entre eles Deltan Dallagnol, um dos personagens mais conhecidos da Lava Jato.


O pacote de diálogos que veio à tona inclui mensagens privadas e de grupos da força-tarefa no aplicativo Telegram de 2015 a 2018. Parte do conteúdo já foi divulgado.


Segundo as mensagens, Moro sugeriu ao Ministério Público Federal trocar a ordem de fases da Lava Jato, cobrou a realização de novas operações, deu conselhos e pistas e antecipou ao menos uma decisão judicial. 


Pelo Twitter, nesta terça (10), o Telegram disse que não há evidências de que seu sistema tenha sido hackeado.


Em resposta a uma pergunta feita por um brasileiro, a conta do aplicativo respondeu em inglês que “não há evidência de nenhuma invasão”. “É mais provável que tenha sido malware [um tipo de vírus] ou alguém que não esteja usando uma senha de verificação em duas etapas”.


O governo Jair Bolsonaro adotou cautela em relação ao vazamento das conversas. A equipe do presidente quer evitar movimentos prematuros, antes que fique clara a dimensão completa do caso.


Embora aliados do presidente tenham defendido o ministro da Justiça e afirmado que Bolsonaro confia em Moro, seus auxiliares recomendaram que o presidente aguarde a revelação de outros trechos dos diálogos entre o ex-juiz da Lava Jato e integrantes da força-tarefa da operação. 


A equipe do governo, no entanto, prevê agitação no Congresso com a divulgação das conversas entre o ex-juiz e Deltan. Um assessor diz que os parlamentares certamente farão “um carnaval”.


Nas conversas privadas, membros da força-tarefa fazem referências a casos como o processo que culminou com a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por causa do tríplex de Guarujá (SP), no qual o petista é acusado de receber R$ 3,7 milhões de propina da empreiteira OAS em decorrência de contratos da empresa com a Petrobras.


O valor, apontou a acusação, se referia à cessão pela OAS do apartamento tríplex ao ex-presidente, a reformas feitas pela construtora nesse imóvel e ao transporte e armazenamento de seu acervo presidencial. Ele foi condenado pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. 


Preso em decorrência da sentença de Moro, Lula foi impedido de concorrer à Presidência na eleição do ano passado. A sentença de Moro foi confirmada em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e depois chancelada também pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).