Desiree Salgado (PDT): academia (Valquir Aureliano)

Professora de Direito da Universidade Federal do Paraná, Desiree Salgado disputa a primeira eleição como candidata ao Senado tendo a educação como principal bandeira. Mesmo sendo novata na política eleitoral, ela quer fazer a diferença, levantando o estandarte da inclusão, como estratégia de impulsão da promoção da diversidade e da igualdade inspirada na “Carte de Lisboa” de Lenoel Brizola ainda no exílio como inspiração para uma política legitimamente democrática e solídária.

Em entrevista ao Bem Paraná, a candidata do PDT explica os passos que considera que o País precisa dar para alcançar o pleno desenvolvimento de suas capacidades e uma situação social em que todos tenham as mesmas oportunidades de galgar uma vida melhor e mais plena.

Bem Paraná – A senhora tem uma longa trajetória acadêmica, inclusive na área de Direito Constitucional e Eleitoral. Porque decidiu entrar na política e disputar uma eleição?

Desiree Salgado – Eu demorei tanto para me filiar porque eu entrei no TRE em 1995. Saí de lá só em 2008. Durante esse tempo, eu não podia ter filiação partidária. Acompanhei eleições desde o início. Eu fiz parte da assessoria de imprensa do TRE durante oito desses quase 14 anos. Sempre gostei. E quando fui virar pesquisadora eu fui para a área eleitoral. Direito Constitucional, Eleitoral. E aí em 2015, com um grupo de mulheres que eu conheci na academia foram me orientando, a gente criou (o projeto) ‘Política Por e Para Mulheres”. Servia para incentivar as mulheres a entrarem na política eleitoral. E muitas dessas mulheres que passaram pelos nossos cursos foram para a política eleitoral. E aí, de repente, veio a oportunidade de eu ir para a política. Eu sempre quis ser senadora. Brincava com as turmas que eu tinha um slogan ‘em 2026 eu conto com vocês’. Eu fazia a conta que em 2026 a minha filha já estaria grande e teria duas vagas para o Senado. Então todo mundo sabia que eu tinha esse sonho de concorrer ao Senado. Mas aí eu resolvi antecipar um pouco as coisas. Exatamente pela demonização da política, a ideia de que a política é uma coisa suja. E eu achei que estava na hora de eu ajudar a ocupar a política. Para fazer uma política que seja de fato construtiva, democrática, plural. E aí só incentivar outras pessoas a irem para esse espaço e eu não ir, ia ficar um pouco hipócrita da minha parte. Aí eu resolvi me filiar ao PDT e concorrer nessas eleições ao Senado.

BP – Porque o PDT?

Desiree – Quando o Brizola estava no exílio e havia a perspectiva da volta do pluripartidarismo ele escreve a ‘Carta de Lisboa’. E essa carta acaba refletindo muito a minha visão de mundo. Desse olhar prioritário para as pessoas excluídas, que a sociedade marginaliza. Por esses grupos minoritários como as mulheres, as pessoas negras, indígenas. E a ideia de, principalmente, defender a educação como grande bandeira. Eu também fiz uma pesquisa em 2018 sobre a democracia dentro dos partidos. Eram 35 partidos. Estudando todos os estatutos, eu vi que o manifesto do PDT é o que mais corresponde à minha visão do mundo e ao papel da política.

BP – Porque o Senado?

Desiree – Talvez porque eu tenha demorado muito para entrar. E aí quando eu chego na política eleitoral eu já tenho idade para ser senadora. O Senado exige 35 anos, eu tenho um pouco mais que isso. E também para o papel que o Senado deve cumprir. Às vezes ele não cumpre. Na construção da legislação federal que é a mais relevante para a ordenação da sociedade, o que pode e o que não pode. E também o papel de controle que o Senado tem em relação ao Executivo. O Senado é quem diz quem vai ser ministro do Supremo Tribunal Federal. Ele pode recusar. Por isso o Senado me interessou mais. Pelo papel constitucional que ele exerce.

SOCIAL

‘Defendo uma renda mínima universal’

Bem Paraná – Uma campanha para o Senado exige uma grande estrutura, recursos. Como a senhora pretende superar isso?

Desiree Salgado – Meu grande desafio é fazer com que as pessoas saibam que eu sou candidata. Com essa campanha curta, me parece que o nosso papel principal é dar visibilidade à candidatura por conta das propostas que vão ser trazidas. Não é só a presença, é o que vem com o discurso. E aí vamos ver no que vai dar. Eu não tenho recursos. Sou funcionária pública desde 2008. Então a gente vai ver como vai ser a aplicação desses recursos que vem do poder público para dar visibilidade à campanha. E o convite para ingressar no PDT foi para disputar o Senado.

BP – Qual a sua avaliação sobre a atuação dos senadores paranaenses?

Desiree – Já a descrição é ruim. Quando a gente pensa que tem três senadores do mesmo partido, que são muito parecidos entre si, não tem nenhuma diversidade, nenhuma pluralidade, a gente tem aí outro problema. Um dos senadores (Alvaro Dias) vai concorrer ao quinto mandato no Senado. Lembrando que no Senado a gente tem oito anos de mandato. Tem gente querendo ficar 40 anos no Senado representando o Paraná. Sem que isso tenha feito grande diferença na vida do povo paranaense. Principalmente na questão da fiscalização e controle do Executivo. Ver como atuou a bancada do Paraná no Senado nesse governo. Desmandos, arroubos autoritários, a tentativa de controlar a corrupção no MEC (Ministério da Educação). Para usar uma expressão gentil, eles foram muito discretos na atuação no momento em que uma instituição como Senado tinha que ter fincado o pé fortemente. Me parecem que não fazem frente à defesa do povo brasileiro e do povo paranaense.

BP – A senhora disse que a principal bandeira é a educação. Dentro dessa bandeira, qual seriam as prioridades?

Desiree – A gente está muito antenada com o projeto nacional de desenvolvimento do Ciro Gomes. Porque aí a gente vai ver, principalmente, a defesa da educação em tempo integral. Meu grande sonho é que não haja uma educação que esteja ao alcance somente de classes sociais mais abastadas. E que as pessoas pobres tenham uma educação terrível. É muito difícil falar em meritocracia quando a gente começa desse jeito. As escolas de tempo integral com um conjunto que despera o interesse da criança e do adolescente. Que não seja só matéria, o tempo todo jogando aquelas coisas que as pessoas podem procurar no google a qualquer momento. Mas que sejam atividades culturais, esportivas, de desenvolvimento pessoal. E também políticas de permanência dentro das escolas de tempo integral. É muito fácil para mim pensar na minha filha passar o dia inteiro na escola. Agora para aquela família que depende dos trocados que aquela criança, adolescente pedindo dinheiro é muito difícil convencer essas famílias que a escola em tempo integral é uma boa ideia. É preciso, também uma bolsa que contemple. Para preparar o terreno para tudo isso, eu defendo uma renda mínima universal. Que as pessoas tenham sempre, independentemente da atividade que elas precisam fazer, comida na mesa. E aí a gente pode pensar na escola em tempo integral. Porque essa família já vai ter recurso para, pelo menos, sobreviver. E aí a criança vai poder ficar o dia inteiro na escola.

REFORMA POLÍTICA

‘Voto distrital é a pior coisa que poderia acontecer’

Bem Paraná – Qual seria a reforma eleitoral dos seus sonhos? Voto distrital misto? Lista fechada?

Desiree Salgado – O voto distrital é a pior coisa que poderia acontecer. Porque a gente tem desde 1932, a defesa da representação dos grupos minoritários. O voto proporcional faz isso. E o voto distrital faz com que você perca todo aquele voto que não foi atribuído à pessoa que ganhou. Ainda mais um sistema que vai começar com um número de partidos altíssimo. É um sistema muito ruim. Tanto que todos os países que adotam o princípio majoritário estão pensando em caminhar para o sistema proporcional. Como nos Estados Unidos. O Brasil seria o único país que caminharia do voto proporcional para o sistema majoritário. O voto distrital misto vai fazer isso com parte da representação. O distritão é pior. O distrital misto também é ruim.

BP – Qual seria o modelo ideal?

Desiree – O modelo ideal, para mim, seria a lista fechada, pré-ordenada. Desde que houvesse democracia interna nos partidos. Não adianta a gente fechar a lista sem provocar uma democratização na maneira como essas listas são fechadas. A lista fechada seria uma boa ideia porque daria mais identidade aos partidos. E tornaria mais baratas as campanhas eleitorais. Outra coisa, aumentar a campanha eleitoral, os instrumentos de propaganda. E garantir espaço para as minorias nessas listas pré-ordenadas.

BP – Mas para fazer essa reforma depende dos políticos, que muitas vezes não querem essas mudanças porque elas vão prejudicar a eles. Como quebrar esse círculo?

Desiree – Imagino eu que elegendo pessoas novas para compor esses quadros parlamentares. A proibição da reeleição do Executivo é uma das primeiras demandas que a gente precisa ter. A partir do momento que a gente proíbe a reeleição para o Executivo a gente começa a mudar a lógica da política. Essa pessoa não vai fazer de tudo para manter o seu próprio poder, cargo. Minha última pesquisa de fôlego foi sobre como o Brasil, muitas vezes, separa o voto para a Presidência da República e para a Câmara Federal. E aí muitas vezes consegue uma ideia lá na Câmara que é outra no Executivo. E aí fica muito difícil para quem está na presidência aprovar reformas. Porque fica muito fragmentado e muitas vezes a maioria nem é do partido da presidência. Fazer com que o povo entenda que não é só uma pessoa. Que eleger uma base parlamentar é importante. Aí essa pessoa vai conseguir essas reformas com essa base parlamentar.

BP – Como surgiu o projeto ‘Política por e para mulheres’?

Desiree – Esse projeto nasce em 2015, principalmente por causa da violência política de gênero. Está acontecendo em 2015 um conjunto de discursos que desautorizavam e atacavam mulheres em espaço de poder. Que era inaceitável a gente ter uma mulher. Hoje em dia está muito pior. Há um estudo feito na América Latina: ‘Quando fazer política nos custa a vida’. Vários casos de mulheres na América Latina que entraram na política e perderam ate a vida. Eu achava que isso estava muito longe, até a Marielle Franco. Que a gente viu como fazer política nos custa a vida. Então o ‘Política por e para mulheres’ é exatamente para fazer essa discussão. Qual a situação das mulheres nesses espaços de poder, quantas são, como a gente faz para inserir as mulheres na política. Eu encontrei na pesquisa que quando a gente vai ter uma disputa por um cargo de direção na empresa. E a gente faz lá, são dez características para você se candidatar a esse cargo. Se uma mulher não preenche os dez, ela não se apresenta como candidata. Se um homem preencher quatro de dez, ele se apresenta como candidato. Então a gente precisa fazer com que as mulheres se sintam preparadas. Começamos a dar curso de direito eleitoral, oratória. Para que as mulheres se sintam preparadas. Mulher faz política desde sempre, em todo o lugar. Só que essa passagem da política para a política partidária é muito complicada.

BP – Nós tivemos alguns avanços como as cotas para candidatas mulheres e a resolução do TSE que determinou o repasse de recursos do fundo eleitoral para elas. O que a senhora acha que ainda pode avançar nessa questão?

Desiree – As cotas foram muito insinceras. Até 1994, se tinha 30 vagas em disputa (para a Câmara Federal) os partidos podiam lançar 30 nomes. Quando veio a cota, em 1995, de 20% de candidaturas, os partidos deixam de só poder apresentar 30 nomes. A cota é de 20%, mas o número de vagas passa a ser 120%. Ou seja, os 20% das mulheres já estava fora da eleição. Quando a cota chega a 30% em 97, a desfaçatez é ainda maior, porque passa a poder ser apresentado 150%. De 30 nomes, 45 candidaturas, dentre elas, 9 mulheres. Nunca foi sincera essa cota. A gente tinha mulheres, às vezes, preenchendo as cotas, mas não tinham tempo no horário eleitoral. A cota não foi para funcionar. Foi para funcionar do jeito que funcionou. Para depois dizerem: ‘viu como não adianta’, ‘mulher não vota em mulher’.

BP – E o que é preciso fazer?

Desiree – Primeiro, não sei de onde tiraram esse número de 30%? Nós somos 52% da população e 54% do eleitorado. Se a gente adotasse a lista pré-ordenada, a gente podia ter o que em outros países chamam de ‘listra cremalheira’. Uma mulher, um homem, uma mulher. Lista fechada alternada por gênero. Uma outra forma seria a reserva de cadeiras no parlamento. Me parece que se a gente quiser ter uma representação com mais a cara do povo brasileiro, a gente vai ter que buscar a paridade. Mais isso é muito difícil de conseguir. O que a gente tem conseguido? Fazer com que candidaturas ao governo estadual se comprometam com a nomeação de um secretariado paritário. O candidato do PDT, Ricardo Gomyde, foi o primeiro a assinar essa carta. Aí a gente vai conseguindo caminhar.

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