
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proferiu recentemente uma decisão histórica que reafirma a liberdade de imprensa e a transparência no Brasil.
No Pedido de Providências n. 0007505-66.2023.2.00.0000, três entidades representativas, a Associação Nacional de Jornais (ANJ), a Associação Brasileira das Agências e Veículos Especializados em Publicidade Legal (ABRALEGAL) e a Associação de Jornais do Interior do Brasil (ADJORI-BR), denunciaram práticas adotadas por corregedorias estaduais que vinham exigindo a publicação de atos extrajudiciais exclusivamente em portais mantidos por associações de cartórios, como o ONR e o RIB.
Essa obrigatoriedade criava, na prática, um monopólio disfarçado, restringindo o direito de escolha de cidadãos e empresas, em afronta direta aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e livre concorrência.
O CNJ foi categórico: não se pode obrigar o uso exclusivo de plataformas privadas, sob pena de concentrar mercado e esvaziar o princípio da publicidade. A decisão reconhece o valor dos meios eletrônicos e reforça a publicidade em jornais de grande circulação, que seguem exercendo papel essencial na divulgação de atos de interesse público.
Vale ressaltar que algumas Corregedorias de Justiça já estão adaptando suas normas para determinar a publicidade em jornais eletrônicos de grande circulação, em consonância com a decisão do CNJ. Como exemplo, cita-se a Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que editou o Provimento n. 30/2025, determinando a publicação em jornais eletrônicos com ampla abrangência e devidamente registrados.
O texto completo está disponível em: https://colegioregistralrs.org.br/img/midias/Provimento%2030%20-%202025%20CGJ-RS.pdf
A importância dos jornais na publicidade legal
A publicação de um edital nunca foi apenas uma formalidade burocrática. Ela é um instrumento de garantia de direitos fundamentais, dando ciência à sociedade de atos que podem afetar diretamente a vida de pessoas, como intimações, notificações de devedores, proclamas de casamento e processos de usucapião.
Uma análise de métricas feita na plataforma SimilarWeb mostra que o portal e-Proclamas (https://proclamas.org.br/), mantido pela ARPEN-BR, recebeu apenas 31.038 visitantes em um mês. Em contraste, jornais de grande circulação registram audiências expressivas e auditáveis, alcançando facilmente centenas de milhares de acessos mensais, e muitos superam a marca de milhões de visualizações, garantindo ampla divulgação e efetividade à publicidade legal.
Substituir os jornais por portais com audiência tão restrita esvazia o princípio da publicidade e aumenta o risco de desinformação. A população deixa de ter acesso pleno aos atos oficiais, que ficam limitados a espaços pouco visíveis e sem transparência de audiência.
Jornais (impressos e digitais) são plataformas auditadas, com métricas públicas de alcance, indexação em buscadores e histórico de credibilidade. Tentativas de substituí-los por sites cartorários pouco conhecidos fragilizam a segurança jurídica e prejudicam a sociedade.
Uma decisão que fortalece a liberdade e o pluralismo
Como advogado responsável pela redação da petição que levou esse debate ao CNJ, considero essa decisão um divisor de águas. Ela reafirma que inovação tecnológica deve caminhar ao lado da legalidade e da liberdade econômica, e jamais criar reservas de mercado em prejuízo da cidadania e da imprensa.
Que esse precedente sirva como orientação para que administrações públicas, cartórios e demais órgãos respeitem o pluralismo, a liberdade de escolha e a função social da imprensa.
A publicidade legal é uma garantia do cidadão e precisa ser tratada com a seriedade e a abrangência que sempre justificaram sua existência.
Trecho dispositivo da decisão do CNJ
“Ante o exposto, dou parcial provimento ao pedido de providências formulado para que os Tribunais de Justiça de todos os Estados da Federação e do Distrito Federal e Territórios adaptem suas normas administrativas extraindo dos dispositivos qualquer menção a que a publicação eletrônica de editais de intimação, notificação ou de qualquer outro ato cartorário seja feita por determinado portal, site, serviço ou prestador específico, seja ele mantido por Associação de Registradores ou não.”
Com essa decisão, fica claro que os jornais de grande circulação, especialmente em suas versões eletrônicas, devem receber as matérias legais e atos oficiais provenientes dos cartórios de todo o Brasil, garantindo ampla publicidade e acesso à informação.
Bruno Camargo da Silva
Advogado. Sócio e fundador da Camargo Silva Consultoria. Professor de Direito Administrativo e Empresarial. Especialista em licitações públicas e autor do Guia Prático de Publicidade Legal das S/A. Coordenador jurídico da ABRALEGAL e consultor de agências e veículos de comunicação especializados em publicidade oficial.