
A terceirização de serviços cresceu no Brasil nos últimos anos, impulsionada por mudanças legislativas e pelo ganho de eficiência operacional. No entanto, com essa expansão, também se intensificaram os riscos legais e reputacionais enfrentados pelas empresas contratantes. Quando uma empresa terceirizada comete erros ou viola direitos, quem responde? O prestador do serviço ou a marca contratante?
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O advogado Assis Neto, especialista em direito empresarial, explica que, embora a terceirização seja prática comum e permitida inclusive para atividades-fim, a contratante não está isenta de responsabilidade caso haja falhas ou abusos cometidos por seus parceiros. “A empresa tomadora pode ser responsabilizada, sim, tanto civil quanto trabalhista e, em alguns casos, até criminalmente se ficar comprovado que houve omissão na escolha ou na fiscalização da terceirizada. Isso é o que chamamos de culpa in eligendo e culpa in vigilando”, afirma o advogado.
A reforma trabalhista de 2017 (Lei 13.429/2017) ampliou o escopo da terceirização no Brasil, permitindo que empresas contratassem prestadores externos até para funções estratégicas e atividades-fim. Apesar disso, a responsabilização subsidiária — e, em alguns casos, solidária — continua sendo uma realidade, especialmente em casos envolvendo direitos trabalhistas ou danos a consumidores e terceiros.
“A contratante tem o dever de diligenciar a regularidade da prestadora de serviços. Isso inclui checar licenças, capacitação dos profissionais, regularidade fiscal e trabalhista e, sobretudo, monitorar como esses serviços estão sendo executados. É uma obrigação permanente”, completa o especialista da GMP | G&C.
Além dos custos judiciais, a exposição pública pode afetar de maneira duradoura a imagem da empresa. Em todos os casos citados, as marcas contratantes sofreram boicotes, protestos e impactos financeiros, mesmo quando não houve dolo direto. A percepção da sociedade é clara: a responsabilidade não pode ser terceirizada. “No cenário atual, a gestão de riscos com terceirizados deve ser parte da governança corporativa. Não basta assinar contrato: é preciso acompanhar, auditar e corrigir rotas constantemente”, orienta Assis.
Casos recentes reacendem o debate sobre terceirização
Diversos episódios chamaram atenção da opinião pública para a responsabilidade das empresas em relação a seus prestadores de serviço terceirizados:
• Caso Muffato (2025, Curitiba): um segurança de empresa terceirizada aplicou uma técnica de contenção proibida (mata-leão), resultando na morte de um jovem acusado de furto. A contratante foi pressionada social e judicialmente a responder pelo caso, ainda que a ação tenha ocorrido fora da loja.
• Caso Carrefour (2020, Porto Alegre): um cliente negro foi espancado e morto por seguranças terceirizados. O episódio gerou repercussão internacional e levou o Carrefour a firmar um acordo de R$ 120 milhões com o Ministério Público para medidas de reparação e inclusão racial.
• Setor hospitalar e condominial: ações judiciais envolvendo falhas de enfermeiros e porteiros terceirizados também vêm aumentando. Em muitos casos, as empresas contratantes foram condenadas por não fiscalizarem adequadamente a execução dos serviços.