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Casos de empresas no Paraná alertam para gênero e sexualidade no trabalho. A recente repercussão do caso de uma clínica em Medianeira (PR), onde foram atribuídos à proprietária supostos áudios impondo critérios preconceituosos para a contratação de funcionários – exigindo que não fossem contratados homens homossexuais –, expôs de forma contundente um problema que muitas vezes é silenciado: a discriminação já no processo seletivo.

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Estabelecer requisitos relacionados à orientação sexual, identidade de gênero, aparência ou estilo de vida não apenas fere a Constituição Federal — que garante o princípio da igualdade e veda critérios discriminatórios de admissão —, como viola frontalmente a Lei nº 9.029/95.

Além do risco de condenações trabalhistas e cíveis, práticas como essa corroem a imagem institucional e demonstram despreparo ético para atuar em um mercado cada vez mais atento às pautas de diversidade e inclusão.

No cenário corporativo contemporâneo, respeitar a diversidade deixou de ser um diferencial de reputação para se tornar uma exigência jurídica e uma estratégia essencial de negócios. Empresas que não compreendem isso enfrentam prejuízos diretos em produtividade, retenção de talentos e engajamento, além de sofrer danos reputacionais de difícil reparação.

Apesar de avanços legislativos e sociais, episódios de discriminação por gênero, identidade de gênero e orientação sexual permanecem frequentes tanto na fase de pré-contratação quanto no ambiente de trabalho.

Gênero e sexualidade no trabalho: condenação de indústria no Paraná

Do ponto de vista jurídico, a responsabilidade do empregador vai muito além de evitar práticas discriminatórias diretas. É seu dever prevenir, apurar e coibir condutas abusivas, inclusive quando praticadas por colegas ou terceiros.

A omissão gera condenações expressivas, como demonstrou o caso recente de uma agroindústria paranaense, obrigada a indenizar em R$ 100 mil um empregado vítima de homofobia diante da inércia patronal frente a ofensas reiteradas.

Ainda que em muitos casos a discriminação não seja explícita, o ambiente de trabalho continua a reproduzir estereótipos que comprometem a igualdade de oportunidades.

Piadas, comentários, segregação em funções ou expectativas baseadas em padrões normativos reforçam um clima hostil e silencioso, que desestimula a permanência de profissionais LGBTQIA+. É nesse contexto que a cultura organizacional exerce papel decisivo: pode ser vetor de exclusão ou instrumento de transformação social.

Pessoas transexuais enfrentam desafios adicionais, que começam já na seleção: recusa ao uso do nome social, restrições ao banheiro correspondente à identidade de gênero e isolamento dentro das equipes.

Soma-se a isso o fator da passabilidade, ou seja, o grau em que a expressão de gênero de uma pessoa trans é percebida como compatível com padrões cisgêneros. Ainda que subjetiva e baseada em estereótipos, essa percepção afeta de maneira direta o tratamento recebido e as oportunidades oferecidas, perpetuando desigualdades.

A Justiça do Trabalho tem incorporado referências como os Princípios de Yogyakarta e o Protocolo do TST/CSJT para Atuação com Perspectiva Antidiscriminatória, além das diretrizes da Agenda 2030 da ONU. Esses parâmetros reforçam que a proteção contra discriminação não se limita ao vínculo formal de emprego, mas abrange também a etapa pré-contratual, onde muitas exclusões se consolidam.

Para evitar riscos jurídicos e promover ambientes inclusivos, recomenda-se que empresas adotem políticas internas claras contra discriminação – com previsão de sanções –, ofereçam treinamentos periódicos em diversidade, disponibilizem canais de denúncia acessíveis e sigilosos, respeitem o nome social e a identidade de gênero, monitorem indicadores de diversidade e envolvam suas lideranças de forma ativa na pauta inclusiva.

Combater a discriminação de gênero e sexualidade é mais do que cumprir a lei: é assumir um compromisso institucional com a dignidade humana. Empresas que integram essa perspectiva de maneira estruturada não apenas reduzem a exposição a litígios, mas também constroem um legado sólido de responsabilidade social, reputação positiva e liderança ética em seus setores.

*Marcelo Jarreta, advogado do escritório De Paula Machado