Dentre as barreiras estruturais ao funcionamento adequado da matriz produtiva brasileira salta aos olhos, em primeiro lugar, a verificação da persistência de taxas de inflação no País em níveis superiores ao dobro da média internacional – em um ambiente de mercados abertos e de acirramento da concorrência entre as corporações no mundo –, alimentadas pelo déficit público e pela preservação dos mecanismos de correção automática de preços, tarifas, salários e contratos.

Uma segunda disfunção está relacionada ao campo do trabalho. Inferências do Bureau of Labor Statistics (BLS), sediado nos EUA, denotam que os encargos sobre a folha de salários correspondem a 32,4% dos dispêndios totais com mão-de-obra na indústria de transformação, contra 21,4% nas economias avançadas, 27,0% no México e 17,0% na Coreia do Sul. Isto sem incluir os gastos com logística, que absorvem quase 8,0% do faturamento líquido das organizações.

Ainda no que tange às limitações impostas pelo mercado de ocupações, emerge a majoração dos salários reais médios, acima dos ganhos de produtividade das empresas e na contramão da trajetória internacional. Esse episódio é fruto da intensificação da formalização das relações de trabalho, do aumento da demanda e da escassez de oferta de mão de obra para os segmentos não qualificados da construção civil e especializados dos campos das novas tecnologias.

Um arranjo preliminar entre alguns indicadores da Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física e da Pesquisa Mensal de Emprego e Salário (PIMES), ambas efetuadas pelo IBGE, proporciona verificar flagrante descompasso na relação entre as variáveis salário real e eficiência industrial, em favor da primeira, pós-crise internacional.

Tanto é assim que enquanto a eficiência fabril (aferida pela variação da produção pela do contingente empregado) cresceu 3,2% a.a., no período 2002-2007, a massa de rendimentos reais subiu 2,1% a.a. Já no lapso 2008-2011, nota-se inversão de tendência, com os ganhos de produtividade e a folha de salários reais variando 1,2% a.a. e 3,5% a.a., respectivamente.

A terceira frente de impulsão dos constrangimentos internos reside nas despesas com energia, grandemente pressionadas pela participação elevada e crescente dos impostos, que correspondem a mais de 1/3 do valor das tarifas cobradas de consumidores industriais, comerciais e residenciais.

Um quarto vetor de abalo à produção diz respeito à carga tributária brasileira, a redor de 35,0% do PIB, bastante acima da média dos países emergentes (25,0% do PIB). Dentre os setores produtivos, o fardo é particularmente mais pesado para a indústria de transformação, que representa 34,0% da arrecadação total, mesmo gerando 14,6% do PIB em 2011, a menor marca desde 1956. Ademais, a tributação incidente sobre as cadeias de produtos industriais equivale a 40,3% do preço final, conforme cálculos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

O quinto obstáculo enfeixa a transferência do diagnóstico de desindustrialização relativa, dos ambientes acadêmicos para as mesas de discussões, decisões e proposições de robustas entidades de classes representativas de empresários e trabalhadores. O fenômeno pode ser evidenciado pelo declínio da participação dos itens manufaturados no valor das vendas externas do País de 54,7% em 2002 para 36,7% em 2011, pela elevação do peso das importações nas aquisições totais de bens de capital para mais de 40,0% e pelo déficit comercial anual dos segmentos de alta tecnologia superior a US$ 80,0 bilhões.

No final das contas, enquanto os agentes sociais brasileiros continuarem abdicando ou postergando a discussão da negociação política e da execução das reformas institucionais de vulto, o setor produtivo continuará a exibir sinais de enfraquecimento, por conta do agravamento das deseconomias externas à porta das fábricas.
Por essa perspectiva, dentre as mudanças de base requeridas destacam-se a ampla reformulação e simplificação do arcabouço tributário (cuja carga cresceu 4,3% em 2011), ou desoneração geral, e da legislação trabalhista, a desindexação, a deflagração de consistentes ações visando à formação e capacitação de mão de obra, e o aprimoramento da eficiência e a redução dos dispêndios com transportes, nos distintos modais.

Igualmente destacável seria a necessidade de adaptação antecipada, principalmente do setor industrial, às nada desprezíveis alterações do perfil de demanda interna e externa, expressas, respecti­vamente, na significativa mobilidade social registrada pelo País nos últimos anos, nas discussões e acordos mundiais sobre o clima, e seus desdobramentos na matriz energética, e na liderança da China, que, por ostentar a condição de maior produtor e exportador de manufaturas do mundo, deve acentuar a especialização em tecnologia e serviços e diversificar os padrões de consumo.

Gilmar Mendes Lourenço, é economista, presidente do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), professor do Curso de Economia e Editor da revista Vitrine da Conjuntura da FAE e autor do livro Conjuntura Econômica: Modelo de Compreensão para Executivos. Foi eleito  O Economista Paranaense do Ano de 2011 pelo CORECON/PR e vencedor do Prêmio Imprensa e Quality TV & Jornais em novembro de 2011. Ele escreve às quartas-feiras neste espaço