GABRIELA SÁ PESSOA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “A Rainha do Sul” não está sozinha. A série que estreia nesta quinta (7) no país, pelo canal pago Space, parece se inscrever em uma tendência televisiva, especialmente a americana: histórias sobre o crime organizado contadas sob a perspectiva de grandes traficantes.
Teresa Mendoza, a primeira protagonista da brasileira Alice Braga na TV americana, é uma mexicana que domina o tráfico em Dallas, no Texas. A cocaína é o elemento que, por passe de mágica e muita porrada, transforma a personagem que começa a história fugindo, com uma mão na frente e outra atrás, em uma “rainha”.
Como a metanfetamina se encarrega da dissolução moral de Walter White, o professor certinho de química transformado em chefe da cadeia da droga em “Breaking Bad”.
Em “Narcos”, vemos uma narrativa inspirada na trajetória do mais célebre narcotraficante da história, o colombiano Pablo Escobar -vivido também por um brasileiro, Wagner Moura. O papel deu projeção internacional ao ator, indicado ao Globo de Ouro neste ano. “Eu e Wagner acabamos não tendo muito tempo para conversar, ele estava loucão filmando, e eu entrei de cabeça também”, diz Alice.
Ou mesmo o Cadu da nacional “1 contra Todos”, que estreou em junho na Fox: um advogado preso por engano com toneladas de maconha precisa assumir a personalidade violenta do traficante para sobreviver ao crime organizado dentro da cadeia.
Estaria a TV viciada nos heróis da droga? O fascínio de tipos como Teresa ou Walter White, opina Alice, vem das altas doses de entretenimento de suas histórias, carregadas de drama e ação.
“Eles são muito distantes da realidade de todo mundo, independente de você viver em cidade violenta ou não. Existe uma curiosidade muito grande. E eles geram muito entretenimento, porque existem muitas possibilidades dramáticas e de ação”, diz a atriz.
Para Breno Silveira, criador de “1 contra Todos”, o apelo está na atualidade, não na distância. Especialmente da audiência latino-americana, que sofre com a violência decorrente do tráfico. “A gente vive refém, é um tema que está todo dia na pauta das cidades”, comenta.
SALTO ALTO
Uma preocupação que Alice -favorável à descriminalização das drogas desde que se fortaleça o combate à violência- conta ter dividido com os roteiristas de “A Rainha do Sul”. “A violência é triste, bruta. Conversei bastante com os roteiristas para não glamorizar, mesmo o projeto acabando com ela sendo poderosa.”
Poderosíssima: no controle do tráfico, Teresa troca os jeans e botas surradas por tubinhos e salto alto, num visual entre a ex-Spice Girl Victoria Beckham e uma vilã de novela mexicana.
A referência não vem à toa: “A Rainha do Sul” originalmente é um livro de Arturo Pérez-Reverte e uma telenovela, exibida pelo canal americano Telemundo.
Sintoma de outro vício das séries contemporâneas, que têm bebido na fonte dos folhetins eletrônicos populares na América Latina -vencedora do Emmy, “Jane the Virgin” se inspirou em uma novela venezuelana.
Comparações à parte, em “A Rainha do Sul” faz toda a diferença entrar no mundo das drogas sob a perspectiva de uma mulher. Trata-se da jornada de superação e sobrevivência de uma jovem imigrante apaixonada pelo namorado, morto por cartéis inimigos, mas principalmente pelo poder.
O primeiro episódio traz boas pistas sobre as motivações de Teresa —segundo Alice, ela “começa Walter White e depois vira Pablo Escobar”. Nos momentos de grande apuro, em que sua morte parece inevitável, ela vislumbra a si mesma banhada em joias, bem sucedida.
Num momento em que as desigualdades de gênero estão na ordem do dia, e a pauta feminista se fortalece no entretenimento, pode ser interessante acompanhar uma mulher reinando em um universo tradicionalmente representado como masculino, como o tráfico.
A maneira como Teresa consegue escapar de um episódio de estupro no primeiro episódio parece um tributo a “Thelma e Louise”, em que Geena Davis e Susan Sarandon fogem tombando homens abusivos pelo caminho.

NA TV
A RAINHA DO SUL
QUANDO qui., às 22h30, no Space