Não se torne aquilo que te feriu. É frase de rede social, de autoajuda da temporada, de títulos de vários artigos, mas vamos dar uma chance ao clichê do momento. Certamente está querendo nos dizer algo. Todo texto desta coluna nasce de uma conversa com pessoas, às vezes de uma entrevista, de uma pesquisa, mas basicamente da convivência humana. Aquela que alguns ainda praticam: cara a cara. Não costumo citar as fontes, mas dessa vez acho importante ressaltar que o assunto derivou de um longo diálogo muito fluido com uma adolescente de 17 anos.

O questionamento era como a gente entra num novo relacionamento (especialmente os afetivos conjugais, mas não só esses) disposto a zerar os contadores. Sem se tornar uma pessoa que carrega a ferida de uma outra história, e que se dane a próxima pessoa da fila. Nessa hora que a frase não se torne aquilo que te feriu entra em cena.

Evidente que nos tornamos outras pessoas com base em nossas experiências, embora muitas vezes repitamos o processo, existe muita recorrência, o tal do looping. Entretanto, não somos mais a mesma pessoa e isso é ótimo. Mas a nova pessoa, o novo relacionamento não precisa vir com o recalque não resolvido. Por isso se chama outra história.

Não vou repetir tudo de novo – Ninguém quer repetir os mesmos erros, mas tem que haver disposição para as novas pisadas de bola. Sim cara pálida, acontecerão novos erros, novas dúvidas ou as mesmas disfarçadas na versão 2.0. Mas isso é a vida.

Todo mundo levou rasteiras na vida profissional, afetiva, nas amizades, nos negócios. Todos. A vida é mutação, aprendizado, renovação. Agora imagina só se o coletivo resolve fazer uma rebelião baseada nos recalques. O próximo (trabalho, amante, amigo e assim por diante) vai sofrer tudo o que eu sofri, porque me tornei amargo, azedo e refratário a todo esse combo ilusório da possível felicidade.

Felicidades são drops. É aquele instante de ocitocina, serotonina que faz bem para a pele, para a vida. Tristeza também. É tão importante quanto o riso aberto, serve para reflexão. Nem uma nem outra são permanentes, assim como as relações, mas optar por ser aquilo que um dia te feriu, creio eu, não demonstra evolução, isso se chama medo disfarçado de força na sua capa de Dick Tracy.

E se uma jovem de 17 anos pode debater com tanta propriedade assim com uma quarentona…

Ronise Vilela é jornalista e ativista nas redes sociais