Make America great again”, faça a América grande novamente. Esta frase e a ideia que propõe foram essenciais para a eleição de Donald Trump à presidência norte americana. Embora se propusesse como um grito de guerra, aparenta mais um choramingo saudosista, como famílias decadentes que sonham com glórias passadas.

 A “América” não deixou de ser grande, tem pelo menos cinco das melhores universidades do mundo, é a capital do entretenimento, ainda tem uma democracia poderosa (ainda), é a maior superpotência militar do planeta, a maior economia, emite a moeda que mais influi no comércio internacional, e é a nação que muitos países querem ser  quando crescerem.   

A questão de fundo é que a recuperação desta glória almejada implicaria numa impossível volta aos anos 1950, quando o país era hegemônico, absoluto.

Tinha ganhado sozinho a segunda guerra mundial, com um pequeno auxílio da União Soviética e outros países; a vitória solitária só existia em Hollywood e na cabeça de muitos milhões de espectadores pelo mundo afora mas era a narrativa que vogava. As guerras localizadas posteriores, principalmente Coreia e Vietnã não tiveram soluções tão filmáveis, pelo contrário, o que se filmou foi a real barbaridade de todas as guerras. E até 1948 tinha o “segredo” da fabricação da bomba atômica, quando os soviéticos o descobriram e fizeram a sua, dando início ao equilíbrio de forças da guerra fria.

O dólar era forte, fortíssimo, até 1971 quando Nixon encerrou o “padrão-ouro” que tornava a moeda quase sagrada; daí sucederam a primeira crise do petróleo e uma desorganização monetária que persiste até hoje.

A indústria automobilística era um orgulho de Detroit e outros centros, carros americanos eram objeto de desejo do mundo todo, em certa medida ainda são. Os operários eram muito bem pagos, tinham inúmeras vantagens não previstas na legislação do país, e seus empregos eram quase hereditários, passando de pais para filhos, genros, sobrinhos. O mesmo ocorria em grande parte das indústrias de porte. Talvez o mais próximo que este país campeão do capitalismo tenha chegado a algo semelhante a socialismo.

Então os japoneses desenvolveram um sistema de produção muito mais eficaz, fabricando carros de alta qualidade a preços bem mais baixos. A entrada desses veículos no mercado americano foi a princípio vista como curiosidade, afinal eram menores que os preferidos pelos clientes; mas combustível mais caro, cidades mais congestionadas e alguma queda de poder aquisitivo determinaram seu sucesso. Esse fato, a que se seguiram carros coreanos, e chineses, contribuiu para o quase fechamento das fábricas; que não conseguindo manter a lucratividade e os benefícios de seus trabalhadores, transferiram muitas linhas de produção para outros países, demitindo em massa. O chamado cinturão da ferrugem (rust belt) no nordeste e meio oeste americanos em que se veem ruínas enferrujadas de fábricas e residências abandonadas, é uma triste imagem dessa crise, que ainda não foi resolvida. Há um enorme contingente de pessoas que, se não perderam empregos, perderam renda e segurança; seu ressentimento não pode ser subestimado e esses antigos eleitores dos democratas votaram em Trump.

Sempre é preciso apontar “culpados” para situações muito ruins, na Idade Média foram as “feiticeiras que causaram a peste negra”, na Alemanha dos anos 1920 e 1930 os judeus “destruíram a economia e causaram a hiperinflação”. Em muitos países de hoje, com destaque para os Estados Unidos, os culpados são “os imigrantes ilegais que roubam empregos e auferem benefícios sociais pelos quais não pagaram”; a solução trumpista é demiti-los e expulsá-los todos. Ocorre que esses imigrantes ocupam funções e fazem tarefas que não atraem muito os nativos, e por salários irrisórios, se forem expulsos será necessário ocupar suas vagas, mas dificilmente “americanos” aceitarão essas ocupações que os envergonham, e se aceitarem quererão um padrão de ganhos de “branco americano”. Um resultado provável é que as empresas sairão do país por inviabilidade de operação complicando mais ainda uma situação já complicada.

As avós de outrora usavam uma expressão interessante: jogar fora o bebê com a água do banho.

Os Estados Unidos, como o Brasil e inúmeros países, foi construído por imigrantes e escravizados,

esquecendo um pouco a brutal injustiça e crueldade da escravidão, os descendentes de imigrantes esquecem também a vinda de seus ancestrais por ter ocorrido em séculos anteriores. Afinal, embarcados do “Mayflower” eram colonizadores, não imigrantes segundo esta ótica.

Complementar a educação formal de todos os imigrantes faria diferença na vida deles e suas famílias, porém faria ainda mais diferença para o país que os recebe.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.