Franklin de Freitas – Serginho Prestes: ele é um dos raros jogadores que brilhou nos três grandes clubes de Curitiba

Sérgio Prestes da Silva nasceu em Curitiba em 1965. Começou nos campinhos do Boa Vista e do Bacacheri, passou pelo Operário Pilarzinho e brilhou no futebol profissional, conquistando o respeito das três grandes torcidas da capital. Uma façanha. Já que raríssimos jogadores conseguiram fazer sucesso nos três clubes (Athletico, Coritiba e Paraná).

Com o bom futebol e os títulos, Serginho virou o ‘Cabeção’. Jogou ainda no ‘Grêmio Show’ e no Fluminense. Brilhou no Pinheiros de 1984 a 87. Pendurou as chuteiras em 1997. Hoje, aos 54 anos, é comentarista da rádio Banda B.

Em entrevista para o Bem Paraná, ele dá uma verdadeira aula de futebol, esbanjando conhecimento sobre tática, detalhes técnicos e físicos do jogo. E conta histórias quentes dos bastidores, como o dia em que o ídolo Dionísio ‘saiu no braço’ com um colega de equipe.

Bem Paraná — Qual foi seu primeiro contato com o futebol?
Serginho — Comecei no Boa Vista, no meu bairro. A gente jogava no campo do BAC, no Bacacheri, na Walfrido do Rosário, mas mais vezes no Corinthians Boa Vista, onde hoje fica o Conjunto Cassiopéia. Ali a gente tinha um dente de leite. Eu e o Neguinho, que depois foi para o Paraná e para o Ituano. Na época, o meu irmão jogava no Operário Pilarzinho e fui com ele pra lá. Meu primeiro clube mesmo foi o Operário Pilarzinho, com o professor Nininho, grande formador de jogadores. Tínhamos um time dente-de-leite. O meio-campo era eu, Geraldinho e Zico, que jogou no Colorado e no Sport. Por incrível que pareça, o grande jogador daquele time era o Geraldinho, muito habilidoso. Por convite do Vinícius, que depois jogou no Coritiba e na Bélgica, fui para o Coritiba, que treinava na base aérea. E foi lá com o professor Miro que a gente deu início nossa trajetória de categoria de base.

A pedido do Bem Paraná, Serginho montou uma seleção com os melhores jogadores que atuaram ao lado dele

BP — Como foi o período de categoria de base e a transição para o profissional?
Serginho — Joguei no Coritiba por um período com o professor Miro, com Vinícius, Edson Borges e Gilsinho. Eu jogava como primeiro volante nessa formação. E numa certa altura, do dente de leite para o juvenil, meu tio e meu pai eram amigos do Raul Passos, presidente do Pinheiros. Numa pescaria surgiu o papo para eu jogar no Pinheiros. O dente de leite do Coritiba não tinha muito apoio, não tinha verba, sem ajuda de custo. No dente de leite, os treinos na Base Aérea eram perto da minha casa. No juvenil, os treinos passaram para o campo do Iguaçu, em Santa Felicidade. Eram duas passagens de ônibus. Minha família não tinha tanta condição assim. Eu, por diversão, fui lá no Pinheiros e fiz o teste. Fui aprovado de cara. Em 80, fui para o juvenil do Pinheiros, com seu Hamilton. No Coritiba, tínhamos feito a final do dente de leite contra o Pinheiros. Junto comigo chegou o Amarildo, também primeiro volante, do Capão da Imbuia, terceiro colocado da competição. Ele era grande e forte. Chegando lá seu Hamilton chamou a gente e disse: ‘Tem um volante aqui, cabelo de fogo, o Roberson Foguinho, que tá subindo. É muito bom jogador. Vou aproveitar vocês mais para frente’. Então ele me colocou na meia e botou o Amarildo de centroavante, por ser grandão, alto e bom cabeceador. Aí seguimos e formamos um juvenil praticamente imbatível na categoria. E seguimos adiante até chegar ao profissional no Pinheiros.

BP — Como foi sua transição da base para o profissional?
Serginho — A gente fala do processo de transição, que é um problema até hoje. A gente não sentiu tanto esse processo de transição, no sentido psicológico, porque o Pinheiros já vinha de uma série de meninos que vinham subindo da base desde os anos 80: Mocelin, Maurício Dantas, Poletto, Toninho, Ademir Alcântara, Norberto, Ribamar. Todos foram jogando cedo. A meia-cancha dos juniores era Marquinhos Benato, Roberson e eu. No ano de 84, por necessidade de composição de elenco, os dois subiram. E foram titulares da campanha do título de 84. Então quando eu subi para o profissional tinham vários jogadores da base. E a gente pegou um grupo fantástico para apoio à gurizada. Tínhamos dentro do elenco verdadeiros pais, irmãos mais velhos: Dionísio, Marinho, Toinho e Caxias. Vários jogadores que davam apoio muito grande. Principalmente os grandes líderes, o Marinho, capitão do time, e o Dionísio, que encarnavam aquela paizão ali. Eles brigavam até. O Dionisio chegou às vias de fato, saiu na porrada com o Newmar para defender o Foguinho. Isso nos deu uma segurança muito grande de jogar ali. Essa foi uma grande vantagem para essa geração.

BP — Nesse processo de transição da base para o profissional, qual a parte mais difícil para o novato se adaptar: psicológico, emocional, físico ou tático?
Serginho — A parte psicológica talvez seja a mais difícil, porque você não está muito seguro e, por isso, não consegue realizar muito bem a parte técnica e tática. Você acaba se diminuindo.
Para mim, isso não aconteceu, mas para outros acontece e acontece muito. E o jogo é muito diferente da base para o profissional. No profissional, você tem mais tempo, você tem mais qualidade no jogo. A base é muita correria, o jogo é mais físico, muita energia. Para alguns falta experiência, aquele manejo. Para o novato se adaptar ter personalidade é fundamental.

BP — No profissional, você pegou um momento especial do Pinheiros? Como era fazer parte daquele time? Na época, o clube tinha fama de ser organizado e ‘rico’. Como era o dia-a-dia no clube?
Serginho — O Pinheiros foi inesquecível, não só pelo período de base, que durou cinco, seis anos. Construímos grande amizades, amizades duradouras. Somos praticamente uma família. Até hoje a gente se encontra. Focando no clube, na parte do profissional, foi um prazer imenso. Representou muito, porque foi início da minha trajetória. O clube era muito organizado, um exemplo de profissionalismo. A direção tratava todo mundo com respeito. Salários muito, muito em dia. Era sagrado. Premiações também. E isso se respondia dentro de campo. Porque na década de 80 o Pinheiros venceu dois títulos e não venceu mais três por detalhe. Então, aquele momento do clube foi especial. Tinha ambiente de família, com todos treinadores que passaram: Borba Filho, Geraldino, Claudio Duarte, Otacílio Gonçalves, que foi um paizão para todo mundo. Daí Carlinhos Neves, Tico, Eros Matozzo, Douglas Pereira… todo staff de treinamento. Era muito bom mesmo. O clube tinha fama de rico, de milionário, mas não gastava exorbitância no futebol. Era dentro da realidade do que o clube possuía. Não tinha os maiores salários do futebol paranaense, mas em contrapartida tinha seriedade muito grande. Os ‘bichos’ saíam sempre na sexta-feira. O adiantamento, o vale, tinha todo dia 20. Era sagrado. O material esportivo não era o mais moderno, mas era confortável, de boa qualidade e quantidade. Tínhamos boa estrutura para fazer um bom trabalho. Profissionais sempre escolhidos a dedo. Por exemplo, Geraldino e Carlinhos Neves tinha sido campeões recentemente com o Athletico e já vieram para o Pinheiros. Era uma grande família com gurus.

BP — Você jogou em um time histórico do Grêmio. Como foi?
Serginho — Saí do Pinheiros e fui para o Belenenses, de Portugal. O Inter, em 87, queria minha contratação para o Brasileiro, mas optei por Portugal. Mas o clube acabou não pagando a primeira parcela da negociação e o Valdomiro Perini, que era nosso diretor, me chamou para o Grêmio. Fui para o Grêmio, com Otacílio Gonçalves e Carlinhos Neves de novo. Encontrei um baita de um clube organizado. Aí foi muito bacana. Estrutura fantástica. Cheguei como titular, jogando bem nas primeiras rodadas. O Grêmio estava com dificuldade de renovar com Valdo e Bonamigo. Eu estava bem individualmente, mas o time não estava tão bem assim. Acabei tendo um problema clínico. E, bem nessa transição da volta do Valdo e do Bonamigo, perdi a posição de titular. O Cuca, que estava jogando adiantado, veio para o meio. E chegou o Lima, aí a equipe acabou deslanchando de uma maneira que, ao final da competição, foi chamada de “Grêmio Show”. Eu participei praticamente de todos os jogos, quando não estava lesionado. Era o reserva que entrava em todos os jogos. Foi fantástico. Depois, no Brasileiro, foi uma equipe competitiva. Fomos até a semifinal contra o Inter, chamado de “Grenal do Século”. Perdemos para o Inter por uma infelicidade.

BP — E a passagem pelo Fluminense?
Serginho — O Fluminense foi após a passagem pelo Paraná. Chegando lá no Rio, eu estava acostumado com clubes muito organizados, e o Rio tem aquela questão que não é tão organizado assim. Aí choca um pouquinho. Mas pela grandeza do futebol do Rio, pela grande do Fluminense, foi muito agradável. O Edinho, que era o treinador, depositava muita confiança em mim. Fiz as primeiras três partidas muito boas. Ao final da terceira partida, em Campos, contra o Americano, tive uma distensão na coxa direita e me atrapalhou demais. Tentei recuperar. Usei de todos os recursos, até o nosso mágico massagista Takahashi aqui de Curitiba. Consegui jogar nas finais do primeiro turno nas partidas contra o Flamengo e contra o Vasco. Joguei parte deles, mesmo que ainda lesionado. Vencemos o primeiro turno. Tratei novamente durante o segundo turno e joguei as finais contra o Vasco. Com dois empates a gente perdeu o título. Aí veio o Brasileiro e fiz uma cirurgia para recuperar essa perna. Foi um ano de muito aprendizado, com jogadores incríveis. Como Sergio Manoel, Ezio… Foi um aprendizado individual para mim.

BP — Você jogou no Paraná, no Coritiba e no Athletico. Poucos jogadores conseguiram atuar bem nos três clubes.
Serginho —A trajetória foi bastante interessante, com bons momentos no Paraná, no Pinheiros, no Coritiba e no Athletico. Foi mais curto no Athletico, mas me deu muito prazer e muito orgulho de ter passado pelas três equipes e ter mantido bom rendimento. De ter deixado sempre algo bom e de ter cativado o carinho dos torcedores. A razão do esporte é a relação da torcida com o clube, com os jogadores. Sempre consegui ter boa relação com as três torcidas. O primeiro foi o Pinheiros. A gente foi campeão. Fui campeão no Coritiba. Tive trajetória excelente. Na sequência, o Paraná Clube, que estava nascendo. Com uma sintonia muito grande entre jogadores, comissão, diretoria e torcida. O Paraná surgiu forte, com uma trajetória vencedora. Conseguimos de cara o título paranaense e o Brasileiro. Então me marcou muito. Minha última passagem do Trio de Ferro foi pelo Athletico, para mim muito marcante. Porque o torcedor tinha aquele ranço de eu ter me declarado torcedor do Coritiba quando eu era menino, de ter jogado no Coritiba e brilhado no Coritiba. E no Paraná também. Mas logo que cheguei e tive conversas com integrantes da Fanáticos e tudo mais. E o rendimento dentro de campo fez com que a relação se tornasse boa. Talvez individualmente onde fui mais importante, fui o jogador decisivo da equipe naquele período. Lembro da sintonia com a torcida, e a torcida do Athletico é quente.

BP — Quais foram seus melhores momentos dentro do futebol paranaense?
Serginho — O título com o Pinheiros de 87. A equipe coroou uma sequência de conquistas. Era uma equipe jovem. Equipe onde eu surgi e tenho um carinho imenso. O Coritiba de 89, que jamais esquecerei, pela qualidade, pela técnica. A equipe encantava não só o torcedor, encantava a gente mesmo. Um admirava o outro. Era muito bacana. Não existia aquele ciúme, aquela vaidade. O Tostão era o grande craque da equipe. Outros brilharam muito naquele time. O Vica, lá atrás, era o ponto de equilíbrio daquele time. Era nosso capitão. Para mim, talvez o jogador mais importante, que ditava as ordens, dava a dura, era nosso treinador dentro de campo, que fazia todo mundo correr. E o Paraná de 91 e 92. Equipe fantástica. Taticamente, não vou dizer que era uma equipe perfeita, porque isso não existe. Aliava técnica com eficácia muito grande. Otacílio montou uma maneira de jogar que hoje se diz moderna, no 2-3-1. João Antonio e Marquinhos Ferreira na linha de dois volantes. Carlinhos Sabiá na direita, Adoilson centralizado e eu pela esquerda. E o Saulo à frente. Então o 4-2-3-1, com funcionamento perfeito. O Sabiá se tornava meia quando a bola estava na esquerda. E vice-versa. A gente tinha sintonia muito boa. A gente tinha muita liberdade de jogar por todos os setores.

BP — Você trabalhou com Otacílio, Minelli e Caio Jr. Qual deles foi o melhor treinador ou qual foi mais importante para a história do Paraná Clube?
Serginho — Trabalhei com o Caio como auxiliar no Cianorte, no seu início de carreira. Foi inesquecível para mim. Ele é mais que um amigo, é um irmão. Mora no meu coração. A perda dele foi algo surpreendente, algo que deixou marca profunda em mim. Admiro muito o trabalho do Caio. Tem uma maneira de trabalhar fantástica. O Minelli foi o primeiro treinador do Paraná. Muito capacitado, inteligente, sério. Pessoa digna, honrada, honesta, transparente. Conhece muito os detalhes do futebol, dos jogadores, dos esquemas táticos. O Ramirez fez um fantástico trabalho pelo Paraná. O Paraná teve grandes técnicos, mas ninguém simboliza tanto a história do Paraná como o Otacílio. Ele foi criado no Internacional e é gaúcho, mas se diz paranista. Só por aí você vê como marcou essa sintonia entre o Paraná e o Otacílio. É meu treinador número um. É uma pessoa incrível, que só fez amigos. Não conheço uma pessoa que teve problemas com. É um gentleman, uma pessoa de um refinamento. E uma simplicidade gigantesca. Estudou na França, inteligência acima da média, e trata todo mundo da mesma forma. Sabia tirar o máximo de cada jogador. Inteligência para enxergar o espaço de cada jogador.

BP — Como foi a convivência com o Caio Júnior?
Serginho — Tive convite para trabalhar no Cianorte por indicação do nosso irmão em comum Ademir Alcântara. Aceitei e sou muito feliz por isso. Tivemos uma sintonia desde o início. Moramos juntos durante uns dois, três meses. Caio era uma pessoa fantástica. Muito sério, transparente, honesto. Muito amigo, muito de família. A grande virtude dele como treinador, algo que poucos treinadores têm, é que ele conquistava a confiança dos jogadores, os jogadores acreditavam no Caio, na transparência, na honestidade, na veracidade dele. Eles sabiam que as ações do Caio eram voltadas pela sua cabeça, pela sua conduta como técnico, suas escolhas eram profissionais. Sempre ele montou grupos muito unidos. E era muito acessível. Queria escutar as opiniões. O Tencatti era treinador dos juniores e ele ajudou muito, porque a base do elenco era dos juniores. O Caio nos ouvia muito e trocava ideias.

BP — É verdade que o Caio proibia carrinho nos treinamentos?
Serginho — Foi logo no começo no Cianorte. Um dia, foi uma discussão minha com um dos zagueiros lá. Cheguei a me indispor com o jogador. Tive a discussão e falei: “para dar carrinho toda hora, até eu. Isso não é futebol”. Na conversa pós-treino, o Caio falou para eu não me indispor com jogadores, mas que eu estava certo. Conversamos e aí proibimos carrinhos em treinos. Se o cara desse carrinho, a gente marcava falta, mesmo que não atingisse ninguém. Essa era uma marca dele.

BP Como foi a transição de jogador profissional para a aposentadoria? Você tentou a carreira de treinador?
Serginho — Na reta final, dois anos antes já estava imaginando parar. Não tive um impacto emocional tão grande. Eu já estava me preparando para esse momento. Estava jogando no América de Natal, mas já tinha escolinhas de futebol aqui (em Curitiba). Resolvi parar e assumir esse trabalho de dar aulas nas escolinhas. Daí tive convite para trabalhar como coordenador da base no Paraná e do Coritiba para ser técnico. Aí trabalhei por quatro anos. Naquele momento, imaginava trabalhar como treinador. Mas esse ambiente do futebol profissional não combinava com meu pensamento. Preferi buscar outros caminhos.

BP — Você sempre jogou na mesma posição em campo? Na época, o futebol era bem diferente taticamente. Hoje, em qual posição você se adaptaria melhor?
Serginho — Joguei em várias funções. E até mais à frente, como atacante. No Pinheiros, jogava como meia mais adiantado, ponta de lança, encostando bem no centroavante. O Grêmio jogava com sistema diferente, com dois jogadores pelas pontas, então os meias tinham que ser mais de compor, então jogava um pouquinho mais por dentro, mais na criação, não tanto meia-atacante. No Coritiba, joguei como segundo meia, como um segundo volante. Eu e o Osvaldo tínhamos obrigações mais defensivas. No Paraná Clube, jogávamos no 2-3-1, então eu era o meia-atacante pela esquerda. No Fluminense, fui camisa 10, jogador mais ofensivo. No futebol de hoje, nesse 2-3-1, a função que mais me agrada é esse meia centralizado. Mas também jogaria centralizado nessa linha do 4-4-2. Ou jogador de lado fazendo composição de meio, não de velocidade.

BP — O que o futebol moderno trouxe de melhor?
Serginho — Essa temática de futebol moderno vale um capitulo a parte. Não consigo separar moderno do antigo. Para mim, são fases, são momentos do esporte. O 433 que hoje é executado por várias grandes equipes do futebol mundial nada mais é que o esquema que eu jogava no início da minha carreira, lá em 79, 80. Então, o que vai alterando são os detalhes. O que mudou é a estrutura dos clubes, a aparelhagem, a preparação física, a qualidade do trabalho de recuperação dos atletas, a fisiologia. O estudo da fisiologia foi muito importante para desenvolver o atleta, para tornar o jogador de futebol mais atleta, mais forte, mais rápido, mais veloz. Isso para mim faz a diferença porque os atletas correm mais hoje, têm mais capacidade, se movimentam mais do que antes. Mas as funções táticas são muito parecidas. Antes se executava numa velocidade e hoje se executa numa velocidade muito maior, porque os atletas têm mais velocidade, mais capacidade física. Os esquemas táticos vem mudando, revolucionando o futebol desde os anos 50, quando o futebol começou a se tornar essa grande indústria. Não vejo que exista algo diferenciado em relação ao que é chamado de futebol moderno.

BP — Qual a parte mais chata do chamado ‘futebol moderno’?
Serginho — Por tudo isso que falei, o jogador hoje se preocupa menos com a parte técnica. Os jogadores nascem e crescem com outras valências na cabeça. A minha geração de meninos tinha outra valência na cabeça. Você crescia com a técnica acima de tudo. O bacana era ser técnico, ter habilidade acima de tudo, ter qualidade no passe, ter o drible, era ser aquele que jogava o que se diz ‘futebol arte’, o futebol bem jogado. Naturalmente foram encontrando antídotos para isso. E esses antídotos foram transformando o jogador em algo com menor qualidade técnica. O que mudou foi essa necessidade de ter mais intensidade, mais força. Isso fez que os jogadores crescessem com menos necessidades técnicas. É uma situação que se agrava no mundo todo, mas em especial no Brasil. O Brasil sempre foi o celeiro técnico. E hoje estamos formando os atletas de maneira equivocada, estamos formando os jogadores com menos qualidade técnica, porque os treinadores visam ganhar, manter seus empregos, e não fazer que os jogadores se tornem mais capazes. Às vezes se troca um título nas categorias de base por trabalhar atletas de menos condição, com força, de altura, porque isso poderia demorar mais. Os clubes são reféns disso. Lá atrás a gente jogava de maneira mais irresponsável, com mais espaço, mais com a técnica. A parte boa era isso. Os jogos eram mais bonitos. Agora o jogo vai ficando chato. Está atraindo pouco os meninos. Muitos preferem assistir Barcelona e Real Madrid, porque lá tem jogadores mais qualificados, mais técnicos.

BP — E dos seus tempos de jogador: qual a melhor e a pior parte?
Serginho — Os gramados. A estrutura do futebol era fraca, os estádios não tinham qualidade. Isso atrapalhava a maneira de se jogar.