BARÃO DE COCAIS, MG (FOLHAPRESS) – A população de Barão de Cocais, a 100 km de Belo Horizonte, passou o sábado (25) à espera de notícias. Por volta das 16h, um alarme falso movimentou por alguns minutos quem estava em uma das praças da cidade. A mensagem dizia que o talude na cava da mina Gongo Soco tinha caído, mas logo foi desmentida.


Desde o último domingo, os moradores aguardam a estrutura cair para saber o que acontece depois. Um documento da Vale, divulgado dentro de uma recomendação do Ministério Público de Minas Gerais, estimava que a queda aconteceria entre os dias 19 e 25 de maio. 


A queda poderia provocar vibrações no solo e servir de gatilho para o rompimento da barragem de rejeitos Sul Superior. Localizada a 1,5 km de distância da cava da mina, a estrutura já se encontra em nível de risco 3 – ruptura iminente ou já ocorrendo. Segundo a Vale, não há dados técnicos para definir como será o impacto. 


O talude se movimentava cerca de 10 centímetros por ano, desde 2012, segundo a Agência Nacional de Mineração. Neste sábado, a deformação chegou a 14,4 centímetros por dia, na porção inferior, e 19 centímetros nos pontos mais críticos.


Em meio a dias de angústia, Barão de Cocais tenta manter a rotina. Durante a semana, bancos e correios foram os únicos pontos comerciais fechados. No sábado à tarde, farmácias e supermercados continuavam abertos e vendendo, e havia movimento normal nas ruas e praças.


“Dependendo do que ouve falar, a gente fica mais em pânico. A gente não sabe o que é real ou não”, diz a atendente de farmácia Rosimeire Ângelo, 48. O local onde ela trabalha está dentro da área que pode ser inundada caso a barragem se rompa. “A gente está só na espera”, diz a colega dela Karine Morais, 22. 


No final de março, quando a barragem teve o nível de risco elevado, as regiões que podem ser atingidas foram marcadas com pintura laranja no meio-fio, placas indicando rota de fuga e pontos de encontro, para onde as pessoas devem se deslocar em caso de rompimento. Um deles, neste sábado, tinha só funcionários que trabalham em obras de contenção da Vale.


Segundo a Defesa Civil de Minas Gerais, cerca de 10 mil pessoas estão em áreas que podem ser inundadas em Barão de Cocais, Santa Bárbara e São Gonçalo do Rio Abaixo. Destas, 6.000 vivem em Barão de Cocais, onde a lama chegaria dentro de 1h12. O dam break –estudo de hipóteses de rompimento– aponta que as inundações se estenderiam até 72,5 km, sendo mais expressivas nos primeiros 52 km. 


“Eu não sei nem expressar o que é isso agora. A gente tem medo que o rompimento do talude venha ser gatilho, porque todas as nossas coisas estão lá. Isso causa medo, transtorno”,  diz Isabel Cristina Batista, 45. 


Isabel está fora de casa desde o dia 8 de fevereiro, quando o nível de risco foi elevado para 2. Por volta da uma e meia da manhã, despertou com o barulho da sirene da Vale. Quebrou a perna correndo para chamar os vizinhos. Cerca de 440 moradores da zona de auto salvamento –a primeira a ser atingida– tiveram de sair do local. 


A família vive na comunidade de Socorro há muitas gerações. Ela morava com os pais, ambos de 82 anos, uma irmã de 57 e o filho de 19. A casa fica a cerca de 2 km da barragem.


“Seriam 6 minutos de distância da chegada da lama. Agora aprendi a contar em lama. A gente não conseguiria escapar se acontecesse o rompimento mesmo”, afirma. 


Os moradores vinham tendo reuniões com a Vale sobre segurança antes de acontecer o rompimento da barragem na mina Córrego do Feijão, em Brumadinho. A tragédia, ocorrida no dia 25 de janeiro, deixou 242 mortos e 28 desaparecidos. O treinamento dos moradores de Socorro estava programado para acontecer em março.


“Isso é horrível, triste o que estão fazendo com a gente. Matando aos poucos. Lá eu conhecia todo mundo, aqui [na cidade] não conheço ninguém”, diz Amarair Paulo de Morais, 46, motorista de ônibus, também de Socorro. 


Segundo o vereador Leonei Pires (PV), 36, desde que houve aumento dos níveis de risco, houve também aumento na rede municipal de saúde. Os atendimentos do hospital municipal Waldemar das Dores passaram de 11 mil ao mês para 17,5 mil. A maioria, diz ele, por sintomas psicossomáticos. 


A rede de assistência social também ficou sobrecarregada pelo aumento no desemprego. Pires diz que já foram encaminhados ofícios a Vale pedindo auxílio nestas áreas, mas sem resposta. 


No fim da tarde de sábado, o deputado federal André Janones (Avante), se reuniu com moradores em uma praça, para ouvir os problemas. Na transmissão ao vivo, em rede social, as pessoas reclamavam da falta de atenção da mineradora, diziam não dormir, passar noites em claro, perguntavam qual será a nova data que vão estimar para a queda do talude e por que não foram tomadas medidas antes. 


Na sexta-feira, depois de sobrevoar a área, o senador Carlos Viana (PSD-MG) afirmou a jornalistas que a Vale poderia ter agido antes e desmontado o talude, para evitar a queda e seus efeitos. 


Isabel, que trabalha como recepcionista num pronto-socorro para família na cidade e é presidente da Associação de Moradores de Socorro, chamou a situação atual que vive de terrorismo. 


“Nosso sofrimento é parcelado, cada dia é uma notícia. O pior agora é a espera. A gente tem certeza que o talude vai romper, mas o que é agrava é o que vai ser depois”, diz.