*Lucas Wadrich Medeiros

O planejamento sucessório atualmente se traduz como uma forma de garantir maior segurança jurídica, economia tributária e comodidade no momento em que as famílias se encontram emocionalmente desestabilizadas. Assim, com a efetivação de um planejamento bem estruturado, o processo sucessório pode se tornar muito mais confortável e econômico para todos os envolvidos neste contexto.
Neste caminho, a constituição de uma Administradora Bens Próprios (também conhecida como holding patrimonial) pode ser um ótimo instrumento para delinear o planejamento sucessório e gerar economia tributária para pessoas físicas que possuam como fonte de renda a locação de imóveis, por exemplo.
No aspecto tributário, o valor gasto em tributos pode ser reduzido desde o momento da constituição da holding patrimonial. Isto é, a pessoa física que pagava 27,5% de IRPF, com a efetivação da holding, deverá pagar aproximadamente 11% a 15%. Vale frisar que neste último pagamento já estariam incluídos outros tributos (CSLL, IRPJ, PIS e COFINS).
Exemplificando, pode-se imaginar uma pessoa física e uma holding patrimonial que recebem R$ 20.000,00/mês. Utilizando as alíquotas mais comuns nestes casos (27,5% e 11,33%), a pessoa física pagaria R$ 5.500,00/mês enquanto a holding pagaria R$ 2.266,00/mês. Portanto, a holding patrimonial traria, neste caso, uma economia em tributos na ordem de R$ 38.808,00 por ano, se comparado com a pessoa física.
Tal instrumento ainda poderia ser utilizado em outros casos. Por exemplo, uma pessoa que tenha como patrimônio um grande número de imóveis, ainda que grande parte desses sejam para uso próprio e não para aluguel. Nesse caso, da mesma maneira, a holding patrimonial geraria uma relevante economia tributária, bem como um eficaz planejamento sucessório.
Outra hipótese é no caso em que a pessoa física tenha parte dos imóveis destinados à locação e a outra parte para uso próprio. Nessa situação, continuaria sendo vantajosa a utilização da holding patrimonial a fim de colocar todos esses imóveis no capital social da empresa. No que diz respeito à sucessão patrimonial, a pessoa física permanece tendo controle e rendimentos dos imóveis enquanto estiver viva. Com o respectivo falecimento, as quotas transferem-se automaticamente para os herdeiros, sem a necessidade do moroso e caro processo de inventário.
Por fim, cabe destacar que o grau de eficiência da holding patrimonial para o planejamento sucessório e tributário varia de caso a caso. Por isso, é aconselhável que o interessado busque um advogado especialista no assunto a fim de que seja estudada a viabilidade de forma personalizada.

*O autor é advogado tributarista. ([email protected]).



DIREITO E POLíTICA

Abaixo Isaac Newton!

* Carlos Augusto Martinelli Vieira da Costa
Qual a razão para tamanha repercussão negativa em relação ao fato do governador do Rio de Janeiro ter comemorado efusivamente, “in loco”, o abate do sequestrador de um ônibus, ontem, no Rio de Janeiro, por um atirador de elite do BOPE? Afinal, o suspeito estava colocando em risco a vida de dezenas de outras pessoas, não é mesmo?
Realmente a situação vivenciada na manhã de ontem, na Ponte Rio-Niterói, foi de extrema tensão, e talvez não tenha havido, do ponto de vista estratégico, outra coisa a ser feita pela PM local senão atirar. Vale lembrar, por exemplo, do caso da menina Eloá Cristina, morta em outubro de 2008 por seu ex-namorado após mais de 100 horas de uma situação de cárcere privado. E segundo análise posterior, nesse largo espaço de tempo o sequestrador teria algumas vezes ficado na alça de mira de um atirador de elite da PM paulista, que optou por não puxar o gatilho.
Na época, a atuação das forças de segurança do Estado de São Paulo foi fortemente criticada e este episódio, por certo, acabou pesando na estratégia escolhida ontem pela PM carioca, o que talvez tenha evitado uma tragédia muito maior.
A questão, porém, é que o Estado, no caso representado pelo governador, não pode “celebrar efusivamente” a violência, mesmo que em legítima defesa, pelas mais diversas razões.
Uma delas porque do Estado espera-se uma posição moralmente superior à média da sociedade, até para que possa exigir dos seus governados as condutas morais e legais necessárias ao bom convívio social, mesmo porque a capacidade de vigiar e punir é infinitamente inferior às possibilidades de violações.
Todavia, nesse caso em especial o que mais chocou foi que se a segurança pública do Estado do Rio de Janeiro já atravessa uma situação completamente caótica, a cena da “celebração” só fez legitimar esse caos, com potencial para agravá-lo. Afinal, como versa a terceira lei de Newton, para toda ação corresponde uma reação igual e contrária.
Oxalá, desta vez, Newton esteja errado!

* Carlos Augusto Vieira da Costa – advogado


A CONDUTA E O DIREITO PENAL

Um país onde se discute tudo

*Jônatas Pirkiel
A discussão da semana é a sanção da Lei de Abuso de Autoridade que deverá ocorrer com veto ou sem veto. De um lado os que são contra e acham que é o fim do mundo, que todos os agentes públicos serão impedidos de exercerem suas funções na plenitude de suas competências, de outro os que acham que a lei é um limitador para os excessos de tais agentes públicos. E, de outro, aqueles que acham que não muda nada, pois a redação da lei 4.898/65 já contemplaria, salvo algumas as pequenas exceções, as situações tratadas na lei recém-aprovada.
Discussão infrutífera, pois a nova lei garante o direito do aplicador de interpretar a lei dentro dos princípios gerais do direito, da doutrina e da jurisprudência, de acordo com o que dispõe o § 2º, do artigo 1º., da lei que revoga a Lei nº 4.898, de 1965 e dispositivos do Decreto-lei nº 2. 848, de 1940, e garante que: “…A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura abuso de autoridade…”. E qualquer discussão será sempre remetida para as instâncias superiores e a jurisprudência será sempre a jurisprudência, existindo uma para cada tese que se adote na defesa ou na acusação.
Ainda, a ação para apurar os crimes previstos na nova redação da lei, na forma do seu artigo 3º, será sempre pública incondicionada, cabendo ao Ministério Público a iniciativa da ação, que somente poderá ser exercida pelo ofendido em caso de que a mesma não seja proposta no prazo legal. Até porque, como se diz popularmente, “corvo não come corvo”. De forma que esta discussão, já superada no Senado e na Câmara Federal com a aprovação do texto final, ainda sujeita a vetos do Executivo, ficará a cargo, na prática, da doutrina e dos tribunais. E, sempre haverá interpretações divergentes desta ou de todas as leis, daí porque existe a jurisprudência.
A lei aprovada, em repetição do que já estabelecia a lei revogada, diz que: “…não se poderá mais questionar sobre a existência ou a autoria do fato quando essas questões tenham sido decididas no juízo criminal…”. Além de outras situações já consagradas pelo direito de tornam desnecessárias as preocupações que estão sendo trazidas por representações de juízes e promotores. O fato é que o cidadão comum, salvo os que praticam os crimes de colarinho branco, raramente se utilizaram da lei anterior ou o farão da que vem em substituição. São raros os casos em que o cidadão comum processa um agente público pelo exercício abusivo de sua autoridade.
Até porque, se assim não fosse, todas vez que um “habeas corpus” fosse concedido ou um “mandado de segurança” tivesse sucesso, haveria um crime a ser imputado a uma autoridade judiciária ou a um agente administrativo. E quanto são os milhares que ao longo dos anos foram concedidos sem que uma única autoridade pública fosse responsabilizada. E, qualquer que seja a lei vigente, o será!

*O autor é advogado na área criminal. ([email protected]


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Transições legislativas referentes à Lei Geral de Proteção de Dados

*Matheus Marques Borges

A antiga Medida Provisória 869/2018, instituída ainda em dezembro do ano passado, surgiu com o propósito de alterar o marco regulatório do Brasil sobre proteção de dados, sendo, desde então, veiculado de forma incisiva pela mídia em geral, sobretudo por seu teor possuir grande efeito nas relações entre sujeitos de Direito.
Isso porque a medida (convertida na Lei 13.853/2019, sancionada em 8 de julho deste ano) prevê a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD, que altera sensivelmente a própria Lei Geral de Proteção de Dados (13.709/2018). Por uma série de razões, entre elas relativas à autorização de despesas por meio do poder legislativo, a medida não possuía em seu dispositivo original a previsão de constituição da referida autoridade.
Tais modificações aprovadas pela lei foram fundamentais para a aplicabilidade da LGPD, visto que, com a ausência de criação da ANPD a lei estaria sujeita a sérios riscos de se tornar irrealizável, contrariando por consequência um sistema que tem demonstrado eficácia mundial, como por exemplo, a GDPR na Europa. Vale ressaltar que, a partir do novo regulamento, a ANPD não está munida unicamente de função consultiva, mas também reguladora e sancionadora das penalidades previstas quanto à violação do tratamento de dados pessoais.
Neste sentido, mesmo que no projeto original a referida autoridade estivesse munida de dependência administrativa e financeira na forma de autarquia, a ANPD foi esculpida em formato de Órgão da Administração Pública Federal, integrante da Presidência da República, composta por Conselho Diretor – órgão máximo de direção –, Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, Corregedoria, Ouvidoria, Órgão de assessoramento jurídico próprio, unidades administrativas e unidades especializadas necessárias à efetivação da lei.
Surgiram críticas da comunidade jurídica brasileira, sobretudo em decorrência do novo formato organizacional, que deu margem à crença de que a ANPD poderia estar vinculada aos interesses do poder público, já que o modelo original autárquico presumia maior autonomia, inclusive em relação à verba para custear o adequado funcionamento como órgão consultor da aplicação da legislação.
A composição multissetorial da ANPD atenua a possibilidade de influência do Poder Executivo sobre as decisões tomadas e demais prosseguimentos da ANPD. No que se refere à regulamentação do tratamento de dados pessoais pelo Poder Público, houve uma clara flexibilização quanto à rigidez obrigacional, evidenciada pelo afastamento do dever do Poder Público de informar à ANPD quando o manejo de dados estiver motivado por razões de segurança pública, pela defesa nacional, ou por razões de atividades de investigação e repressão de infrações penais, proibindo que a totalidade do tratamento de dados seja realizada por empresa de direito privado.
Além disso, segundo a antiga MP 869, era facultativo à ANPD requisitar aos envolvidos no manejo de dados a emissão de relatórios de impacto à proteção de informações pessoais. Contudo, tal faculdade foi revista pela Lei 13.853/2019, e então houve um restabelecimento do texto original da legislação.
Não se limitando a isso, se tornou obrigatório pelo Poder Público o uso compartilhado de informações com a iniciativa privada à comunicação do titular do dado. A ANPD é uma medida extremamente desejável e salutar para a manutenção de um Estado Democrático de Direito.
Outra impactante divergência entre os textos legislativos foi que a MP 869 propôs  ainda excetuar a vedação de transferência de dados da Administração Pública a entidades privadas, pela indicação de um Encarregado de Proteção de Dados, o que foi revisito pela Lei 13.853/2019, que revogou essa possibilidade.
Entre os benefícios trazidos pela Lei 13.853/2019, é válido mencionar a abrangência que cerceia a LGPD, passando de lei federal para lei nacional, de maneira a fazer com que os estados, Distrito Federal e municípios, por possuírem capacidade legislativa residual, fiquem com um estreito espaço para legislar acerca de temas que a LGPD não mencionar.
Outra inovação da Lei 13.853/2019 faz alusão às sanções, uma vez que ela flexibilizou as penalidades nos casos de acesso ou vazamentos não autorizados de dados, caso haja conciliação entre o controlador e o titular de dados. Não obstante, na hipótese dessa eventual composição ser infrutífera, o controlador permanece sujeito a sanções elencadas pelo art. 52 da Lei 13.709.
Nesse caso,  existe a possibilidade de o mesmo arcar com multa de até 2% do faturamento anual (válido para pessoa jurídica de direito privado). O valor pode chegar a R$ 50 milhões por infração. Ainda no que tange às multas, a lei definiu que todos os valores arrecadados serão destinados ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos.
Não obstante a prorrogação fomentada pela Lei 13.853/2019, que alterou de 18 para 24 meses o lapso para entrada em vigor de grande parte dos dispositivos relativos à regulamentação do manejo de tratamento de dados, algumas dessas previsões legislativas, sobretudo aquelas referentes à criação da ANPD, passaram a ter vigência imediata, seguindo exemplo dos sistemas legislativos relacionados ao tema, como a GDPR.
Diante de todo o exposto, a antiga MP 869, além de propor um modelo controverso alusivo à ANPD, ainda realizou pontuais ajustes estratégicos na LGPD que poderiam representar um comprometimento de sua eficácia, se não fosse novamente a atuação do Legislativo, restabelecendo algumas garantias quanto ao sentido do texto original aprovado.
Restam agora a vigilância e a atuação decisiva da sociedade em geral para garantir a atuação imparcial da ANPD, incluindo interesses do Poder Público e da esfera privada, no sentido de assegurar que todas as atribuições designadas à ANPD estejam em pleno vigor, para assim fazer jus aos benefícios galgados pela lei.

*O autor é advogado da FH, empresa de tecnologia especializada em processos de negócios e software. [email protected].



PAINEL

Médico
Médico estrangeiro não precisa ter certificado de proficiência em língua portuguesa para revalidar diploma. O entendimento é da 7ª Turma do TRF da 1ª Região.

Inocente
O Estado deve indenizar preso preventivo que foi posteriormente absolvido por falta de provas. O entendimento é da 27ª Vara do TJ do Rio de Janeiro.

Grávida
Empregada grávida que recusou a proposta de reintegração ao emprego não tem direito a estabilidade. O entendimento é da1ª Turma do TRT da 18ª Região.

Cartório
Titular de cartório não responde por atos lesivos praticados por seu antecessor. O entendimento é da 3ª Turma do STJ.

Associação
Associação de moradores não pode cobrar taxas de não associados. O entendimento é da 2ª Câmara de Direito Privado do TJ de São Paulo, que entendeu que o simples fato de morar no condomínio não obriga nenhuma família a se associar ou pagar quaisquer taxas.



DIREITO SUMULAR

Súmula nº 628 do STJ – A teoria da encampação é aplicada no mandado de segurança quando presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; b) manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas; e c) ausência de modificação de competência estabelecida na CF/88.


LIVRO DA SEMANA

A obra tem como foco a contextualização da diferença que culminou os julgamentos de bruxaria em Salem. Inicialmente, o estudo apresenta que em todas as civilizações antigas existiu um culto à Mãe Criadora e mantenedora da vida. Suas representantes humanas, as mulheres, eram honradas e respeitadas pelo seu dom milagroso de gerar vida em seu ventre. Com o de­senvolver da história, o patriarcado assumiu o poder e passou a oprimir as mulheres. Para explicar o porquê as mulheres passaram a ser o principal alvo da Inquisição, segue-se um estudo sobre a visão antropológica e eso­térica da magia, seguido da construção e negação do “outro”, a demonização da mulher e, consequentemente, a caça às bruxas. Nesse contexto, é apresentada uma nar­rativa dos eventos ocorridos em Salem, acompanhada de análise jurídica e interpretações de um olhar entre o real e o imaginário. Concluindo o estudo, temos hoje um reencontro entre o sagrado e o feminino, onde magia e cura são vistas como parte de uma expressão natural da feminilidade.