“Quando você começa a normalizar o autoritarismo, a corrupção e as violações antidemocráticas, as pessoas começam a aceitar isso e fica muito difícil reverter.” Essa avaliação do analista político americano Brian Klaas reflete a preocupação de muitos eleitores no Brasil e em países como os Estados Unidos, que viram o Capitólio ser invadido por partidários de Donald Trump na data em que o Congresso estava reunido para certificar a vitória de Joe Biden. No livro Corruptíveis: o que é o poder, que tipos de pessoas o conquistam e o que acontece quando chegam ao topo, Klaas discute a necessidade de se reformar sistemas para evitar que a corrupção seja prática dos que detêm poder.

Por que decidiu escrever esse livro?

Quando eu penso em todo o progresso que fizemos em todas as áreas da sociedade, vejo o quanto avançamos. Mas, quando se trata de poder, temos a mesma pergunta que tinham os gregos e romanos na Antiguidade: “Como colocamos as pessoas erradas no poder?” Alguns pensam que é problema inerente à humanidade, mas acho que podemos reformar sistemas e fazer com que eles funcionem e, assim, ter melhores pessoas no poder.

Mas a corrupção está presente em todos os níveis de nossa sociedade.

Quando se tem a cultura da corrupção e sistemas que permitem a corrupção, isso atrai pessoas corruptas. De maneira geral, sistemas errados atraem pessoas erradas. O ditado diz que o poder corrompe. O livro fala que isso é totalmente verdadeiro, mas acredito que há uma necessidade de reformar o sistema primeiro para que ele funcione direito. Se você não é corrupto, precisa achar esse sistema atrativo. Os políticos brasileiros modernos não parecem tão atrativos porque temos um sistema que está afetando a estrutura de poder.

É possível calcular o impacto do governo Trump para a democracia dos EUA?

Sim, foi um dano enorme. Primeiro porque, e aqui existe um paralelo com o Brasil, a democracia basicamente funciona de acordo com normas e Trump violou quase todas. Como resultado, ele tornou essa prática normal. As novas gerações de republicanos estão fazendo as mesmas coisas, testando o sistema como ele testou e vemos riscos significativos ao processo democrático. O problema maior é que o partido dele, o Republicano, está se tornando autoritário e vimos isso com o episódio de 6 de janeiro. O que acho preocupante é que, quando você começa a normalizar o autoritarismo, a corrupção e as violações antidemocráticas, as pessoas começam a aceitar e fica muito difícil reverter.

No Brasil, vemos em alguns discursos políticos que vale tudo em nome do combate à corrupção. Qual é o risco desse discurso?

Proteger o sistema da democracia é mais urgente do que qualquer outra questão que exista, mais do que a questão da corrupção. E a razão para isso é que, uma vez que a democracia se vai, é muito difícil recuperá-la. A maioria dos países que analisei onde a democracia havia sido quebrada, ela não havia sido recuperada, os países continuam sendo autoritários ou ditaduras. É muito mais fácil defender o que resta da democracia do que tentar trazê-la de volta após ser destruída. Pessoas que são corruptas acusam oponentes de serem corruptos. Não estou dizendo que não deveria haver preocupação com a corrupção. Apenas digo que é preciso ter cuidado, porque qualquer movimento anticorrupção pode ser usado para que as pessoas que estão no poder e as que estão fora sejam tratadas de forma diferente quando agem de forma corrupta.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.