Divulgação – Tony (Ansel Elgort) e Maria (Rachel Zegler) se apaixonam em ‘Amor

Filmes musicais foram uma grande onda do cinema nos anos 1960. Só entre os vencedores de Oscar nessa década, houve ‘Amor, Sublime Amor’ (1961), ‘My Fair Lady’ (1964), ‘A Noviça Rebelde’ (1965) e ‘Oliver’ (1968). Mas, passados 60 anos, os musicais viraram démodé – ‘La La Land’, de 2016, é uma exceção, e ‘Cats’, de 2019, depõe contra esse gênero de filmes na atualidade. Além disso, refilmagens de filmes grandiosos do passado não costumam dar bons resultados, vide os exemplos de ‘Ben-Hur’ e ‘A Volta ao Mundo em 80 Dias’. Dito isso, a única coisa que realmente justifica uma refilmagem do musical ‘Amor, Sublime Amor’ tem nome e sobrenome: Steven Spielberg.

Spielberg é um dos maiores nomes da história do cinema e tem uma cinebiografias das mais diversificadas. Fez filmes que beiram o terror (‘Tubarão’), emocionantes aventuras infantojuvenis (‘ET’), super-heróis, ou quase isso (‘Indiana Jones’), dramas pesados (’A Lista de Schindler’), animações (‘As Aventuras de Tintin’), romances (‘Alem da Eternidade’), filmes de guerra (‘O Resgate do Soldado Ryan’), ficção científica (‘Minority Report’), mundos virtuais (‘Jogador Número 1’) e até dinossauros (‘Jurassic Park’). Faltava um musical em sua carreira.

Originalmente, ‘Amor, Sublime Amor’ é uma versão da peça musical ‘West Side Story’, que estreou em 1957 na Broadway. Baseada num livro de Arthur Laurents, a peça tem músicas assinadas por Leonard Bernstein (melodias) e Stephen Sondheim (letras). No West Side, um bairro pobre de Manhattan (Nova York), há a gangue dos Jets, composta basicamente por proletários de origem irlandesa, e a dos Sharks, composta basicamente por imigrantes de Porto Rico e seus descendentes. Em meio à rivalidade entre as duas gangues, a portorriquenha Maria (Rachel Zegler) se apaixona por Tony (Ansel Elgort). Maria é irmã de Bernardo (David Alvarez), líder dos Sharks, ao passo que Tony já foi líder dos Jets. Parece uma versão de ‘Romeu e Julieta’, de Shakespeare? Sem dúvida; tem até cena do balcão.

Em sua época, ‘Amor, Sublime Amor’ levou 10 Oscars – incluindo melhor filme e diretor, para Robert Wise. E pelo menos quatro das músicas de Leonardo Bernstein e Stephen Sondheim viraram hits globais. ‘Maria’, ‘Tonight’, ‘America’ e ‘Somewhere’ ganharam as mais diversas vozes, de Marvin Gaye a Shirley Bassey, do tenor espanhol Placido Domingo ao roqueiro brasileiro Renato Russo.

A nova versão tem a playlist de Bernstein/Sondheim e um visual que é a cara de Spielberg. Diversos tipos de enquadramentos e movimentos de câmera presentes em ‘Amor, Sublime Amor’ são típicos do diretor. Outro elemento cinematográfico chama atenção: as cores. Os Jets são retratados sempre com tons azuis, verdes e cinzas. Já os Sharks estão sempre de vermelho, laranja e amarelo.

Spielberg fez pelo menos três acertos gigantescos em sua versão de ‘Amor, Sublime Amor’. Primeiro: os atores que interpretam os portorriquenhos são realmente de ascendência hispânica. No filme de 1961, eram atores brancos com pele tingida para parecerem latinos. Isso inclui Natalie Wood, a Maria do filme original, que é descendente de russos. Rachel Zegler, a Maria atual, é filha de uma colombiana. E David Alvarez, canadense de nascimento, tem pais cubanos. No elenco, há pelo menos 20 portorriquenhos.

O segundo grande acerto é a presença da atriz Rita Moreno, remanescente do filme original e a única realmente portorriquenha do elenco principal. Na versão de 1961, ela era Anita, namorada de Bernard. E venceu o Oscar de melhor atriz coadjuvante. Desta vez, ela é Valentina, a dona de uma loja que abriga Tony, um papel que não existia na versão antiga – foi criado especialmente para a atriz, que completa 90 anos neste sábado (11).

O terceiro acerto pode parecer uma frivolidade, mas tem razão de ser: as falas dos portorriquenhos são em espanhol e sem legendas. “Se legendasse o espanhol, estaria simplesmente colocando para baixo do inglês e dando ao inglês o poder sobre o espanhol. Isso não ia acontecer nesse filme, precisava respeitar o idioma o suficiente para não legendar”, disse o diretor. Uma ideia de pertencimento que cabe nos dias de hoje, e até norteia o filme, mas que não cabia nos anos 60. E que eventualmente não estaria no filme se Spielberg não fosse Spielberg.