“Mamãe me declarei para fulana. Mas e se ela não gostar de mim, eu continuo gostando dela?”. A pergunta do Bernardo não me pegou de surpresa. Há tempos que ele fala que gosta da menina (que é linda diga-se de passagem). Fiquei até orgulhosa dele ter tomado coragem e ter se declarado, afinal falar dos sentimentos sempre faz bem.
O que me pegou de surpresa foi a minha dúvida na hora da resposta. Conto que ele corre o risco de não ser correspondido? Conto para ele que amar sozinho é duro, dói e que provavelmente ele vai passar por isso ao menos uma vez na vida? Ou faço de conta que tudo é uma maravilha?
Desde que os filhos nascem a gente faz de tudo para protegê-los. Das coisas mais simples como agasalhá-los para não pegarem gripe até a neura de virar a sombra para que eles não se machuquem. Bem, ao menos comigo sempre foi assim. Sempre fui uma mãe neurótica. Nunca quis que ele se machucasse – embora tenha parado em hospitais muitas vezes , passamos por duas cirurgias (simples, mas mesmo assim cirurgias), fui chamada na escola em inúmeras ocasiões.
Mesmo assim, a gente não se acostuma. Filho não nasceu para sofrer. De jeito nenhum. Por isso a minha dúvida na hora de responder ao Bernardo. Aos 10 anos ele tem conflitos um pouco mais complexos do que decidir se é o Homem Aranha ou o Batman, se toma suco de uva ou de laranja. Quer saber, como eu já disse, se será correspondido no amor. Quer saber até onde pode tirar sarro do amigo e em que ponto a brincadeira é bullying, quer saber se há vida após a morte, quer saber porque os pais se separam, quer saber como funciona uma relação homoafetiva, e por aí vai.
Não é o fim do mundo, muitos irão pensar. Que exagero, outros vão dizer. Há alguns dias ele quis discutir a II Guerra Mundial. Resolvi então colocar em prática a tática do realismo. Contei um pouco do que sabia e falei do Holocausto. Queria que ele refletisse sobre intolerância. Aí quando vi a reação dele percebi que havia exagerado nos relatos dos fatos históricos. Ele ficou perplexo com o número de seis milhões de judeus mortos.
Aí que entra a dúvida que me assola: até onde a gente fala da realidade com as crianças? Até onde a gente tenta manter a inocência da infância? E ainda tem tanta coisa para falar. Violência, drogas, honestidade, cuidados com a internet, abusos de todos os tipos. Vê como é difícil?
O fato é que criar filhos é aprender um pouquinho todo dia. Aprender a rever conceitos, aprender a ceder, a deixar a ansiedade um pouco de lado, aprender a exigir menos de si e dos outros, aprender, aprender, aprender…E como tenho aprendido!
Dizem que a gente cria os filhos para o mundo. Mas criá-los para esse mundo em que vivemos me parece assustador. Bem, dizem também tantas coisas sobre ser mãe. Que a gente ganha força que nunca teve, que por instinto acerta mesmo quando erra, que o amor entre mãe e filho compensa tudo. Então vamos em frente. Hoje novas perguntas devem ser feitas. Já estou me preparando para as respostas.
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