A Igreja Católica é um exemplo de como a religião sofreu o impacto do Iluminismo. (Imagem: Pixabay)

O fim da Idade Média, a partir do século XVI, foi uma ocasião em que o homem foi exposto à toda forma de repressão política, cultural, religiosa e social, sendo referenciada por muitos como “a Idade das Trevas” para a humanidade. Tal período finalizou após a queda do Império Romano do Ocidente, que marcou a transição da humanidade para a Idade Moderna. 

Nesse período, o ser humano não era considerado um ser pensante, capaz de responder por seus pensamentos e viver com dignidade ante a sociedade em que habitava. Tanto que muitos filósofos da época não podiam colocar em prática suas ideias, difundindo-as a um determinado grupo de pessoas ou até mesmo para o povo em geral, pois se isso ocorresse, certamente estariam colocando em risco não só todo o trabalho que construíram, mas também suas vidas. Pensar demais era perigoso! 

No campo científico, toco conhecimento carecia de respaldo, bem como as áreas de moral, de liberdade religiosa (marcada pela intolerância) e também o campo social (salientava-se cada vez mais a divisão de classes e a problemática da fome, da exclusão racial, do comportamento jocoso perante a mulher e concentração de renda nas mãos de uma minoria detentora do poder). 

Especialmente no contexto político, o homem era “aprisionado” pela forma de poder vigente: o absolutismo, que nada mais era do que o “símbolo” de sua limitação política. Tal regime mantinha a participação nas decisões sociais de cada Estado reservada ao rei ou imperador da época e, às vezes, também a um número reduzido de membros da nobreza.

Com o emergir do século XVIII, a tentativa de romper com toda essa forma de intimidação e “escuridão” deu origem ao Iluminismo, movimento que buscava rigor filosófico, político e social em seus fundamentos e que pretendeu utilizar-se da razão como a melhor forma para conquistar emancipação, liberdade e autonomia no campo social, político e econômico.

Iluminismo trouxe realmente luz à humanidade?

O processo de virada antropológica causado pelo Iluminismo foi a oportunidade ideal para trazer “luz” e conhecimento à mente e à vida da população revolucionária, inspirada por pensadores como Pascal, Voltaire, Hume, Kant e Hegel, dentre outros. Os iluministas acreditavam que o crescimento crítico era importante para melhorar a educação e a situação social de uma sociedade. Tal linha de pensamento tinha muita influência nas questões da razão e natureza, buscando a compreensão dos fenômenos físicos. Contudo, o contexto social da época especialmente denotado pelo lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” eclodido com a Revolução Francesa no ano de 1789 os fez direcionarem suas teorias mais para a análise de elementos sociais.  

Nesse sentido, há de se perceber que o Iluminismo apresentou muitos aspectos positivos, como suas contribuições para o desenvolvimento das ciências e do pensamento ocidental, ou mesmo seu caráter universal tendo em vista a defesa dos direitos humanos e da dignidade humana.

Porém, pela pulverização demasiada de seus pontos de vista, é importante perceber que o Iluminismo também continha elementos frágeis e negativos. Ao colocar todo o seu enfoque na razão humana, permitiu uma diversidade conflituosa de teorias sob seus alicerces, que muitas vezes eram contraditórias e inconsistentes.

Impacto do Iluminismo ao ambiente religioso

Como exemplo pode-se citar as condenações que proferia à Igreja Católica – acusada de, até o fim do século XVII, ter se impetrado na política, confundindo-se muitas vezes com o Estado e concentrado todo o poder possível sob sua esfera – mas que também por ter seu papel de defesa da vida, da busca por uma sociedade de paz e em especial a proposta que oferece para a vivência do Evangelho na vida diária, não foi abandonada pela maioria de seus críticos.

Tal elemento foi um fator importante para a desmistificação da fé, uma vez que, com o avanço do ânimo exacerbado pela ideia da razão sobre a fé, formaram-se grupos de discussão compostos pela aristocracia (autointitulado “despotismo ilustrado”). Isso proporcionou aos cristãos uma série de discussões racionais sobre a fé e as crenças, motivo que proporcionou o rompimento da visão mítica e mágica da religião.

No entanto, não se pode negar que o iluminismo foi decisivo para o declínio da Igreja ao mesmo tempo em que impulsionou o avanço do secularismo que até hoje persiste, além de firmar as bases para o liberalismo econômico e político do século XIX, uma vez que as ideias iluministas francesas influenciaram as instituições políticas modernas. Até hoje, com pequenas modificações, a maioria dos países mantém características estatais baseadas nos pensamentos iluministas.

Portanto, com acertos e desacertos o iluminismo não pode ser descartado diante de sua importância na história, mas compreendido em suas diferentes interfaces para que possamos realmente ter uma sociedade baseada em liberdade, fraternidade e igualdade entre as pessoas e, em especial, a convicção de que se faz imprescindível repartirmos ideias para que todos tenham um pedaço de pão.

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* Ana Beatriz Dias Pinto, é comentarista convidada do blog e nos traz reflexões sobre temas atuais e contextualizados sob a ótica do universo religioso, de maneira gratuíta e sem vínculo empregatício, oportunizando seu saber e experiência no tema de Teologia e Sociedade para alargar nossa compreensão do Sagrado e suas interseções.