A Revelação por parte de Deus ao homem só é possível através de um processo comunicativo (Imagem: Pixabay)

No dia a dia de cada ser humano sentimos necessidade de expressar ao exterior nossos sentimentos, pensamentos, desejos, informações, ideias e isso só se tornam possível por meio da comunicação, por isso ela possui tanta importância para a própria constituição do ser humano e se torna cada vez mais importante se comunicar bem no processo de integração com o mundo que nos rodeia. O ser humano necessita desta relação, ele não é estático ou isolado, necessita estar com o outro e promover este encontro[1].

Tamanha é nossa necessidade de nos comunicar que nos dias atuais se criou uma dependência dos meios de comunicação que tem causado uma absolutização desta forma de conhecimento, frequentemente tratada como única e verdadeira frente às demais. Segundo Martins[2], isso se deve a uma “saudade da comunicação” presente no coração do ser humano que comprova que esse tipo de comunicação mediática é irrisório frente a sua imensidão real.

É a partir desse dessa busca constante do ser humano que surge a comunicação no âmbito da teologia, pois a Revelação por parte de Deus ao homem só é possível através de um processo comunicativo pelo qual Ele apresenta seu plano de salvação, a sua Palavra. Deus escolhe o ser humano e lhe confia sua missão e isto exige que ele esteja aberto e que responda a este diálogo iniciado pelo próprio Deus[3] que o colocou no mundo para que cuidasse de sua obra[4].

Ao longo do Antigo Testamento são muitos os momentos em que Deus fala por meio dos profetas, essa palavra também está presente na criação e em todos os demais acontecimentos, porém poderíamos afirmar que o falar de Deus é metafórico, pois não é um fato histórico, mas um modo humano de perceber sua presença e, por isso, buscamos expressá-la à nossa maneira[5].

Essa revelação acontece também de maneira “especial”[6], que dá tanto por Jesus Cristo quanto pela palavra escrita que tem seu ápice no Verbo Encarnado. Desta forma, nesse comunicar de Deus (Jesus Cristo) a comunicação ganha maior consistência porque vai além da limitação humana:

 

Jesus Cristo é um caso único na comunicação, a partir do qual percebemos plenamente o valor humano desta, a sua meta e, também, a sua origem: Deus é comunicação. Por isso, não devemos temer considerar a Jesus como «o comunicador perfeito»[7].

O fato novo de um Deus que envia seu Filho é a maior prova do desejo deste de relacionar-se com sua criação. Por tornar presente na história o rosto misericordioso de Deus, em sua vida Ele também revela o projeto do Pai para todos os seres humanos[8] que é dar voz àqueles que já não tem forças para falar.

O método comunicativo de Jesus (a parábola) é evidentemente simples, acessível para toda e qualquer pessoa. Esta forma de se revelar desperta a confiança das pessoas, pois toca no âmago de cada uma delas, essa abertura e acolhida é que torna possível o diálogo e o encontro de cada um com o projeto salvífico do Pai e consigo mesmo, suas histórias e dramas pessoais[9].

A comunidade dos seguidores de Jesus surge a partir desta experiência do Ressuscitado. No cristianismo primitivo o que movia a comunidade era a palavra pronunciada pelos apóstolos que testemunharam a vida de Jesus e buscaram torná-lo presente na vivencia comunitária, no exercício da caridade e nas celebrações litúrgicas.

É este sentido que a Igreja é reconhecida como “sacramento visível”[10], ela é destinada a comunicar e trazer presente o mistério da palavra pronunciada por Deus na história do ser humano e sua entrega total. Nos dias atuais este exercício eclesial se dá por meio da liturgia, da catequese e outras atividades pastorais, que nada mais são que processos comunicativos da evangelização pedida por Jesus [11].

Vivemos num tempo muito propício para o exercício deste projeto eclesial de maneira mais eficaz devido ao aumento contínuo de possibilidades de anúncio através dos meios de comunicação, principalmente as redes sociais. Contudo, à medida que se aumentam a variedade e a eficiência dos meios de comunicação, também se dá voz a um número cada vez maior de pessoas, e estas muitas vezes usam estes recursos com um objetivo totalmente contrário ao que a própria comunicação se propunha.

Tais “comunicadores” ao invés de promover o encontro e o diálogo fazem com que cada dia mais seus “seguidores” se distanciem daqueles que são diferentes, tornando-se assim “protagonistas do mal”[12] em meio a sociedade. Muitos destes ”comunicadores” infelizmente se intitulam cristãos e acabam por tornar sua mensagem um instrumento que contradiz totalmente o cerne do comunicar e da própria mensagem cristã que é a comunhão.

Considerando o constante processo de diálogo de Deus com seu povo tanto na Antiga como na Nova Aliança fica claro a importância e de uma maior compreensão de como o exercício da fé cristã está totalmente ligada e depende de uma Teologia da Comunicação para sua correta compreensão e para que seja mais eficaz.

Além disso, o cenário atual de evangelização cristã por meio das mídias faz com que percebamos a pouca valorização desta área de estudo, pois boa parte dos atuais comunicadores opta por caminhos que contradizem o sentido pleno da encarnação do Verbo.

Tendo em vista a grande influência de muitos comunicadores cristãos na formação atual dos membros da Igreja, que ultrapassam a própria realidade paroquial, às vezes transpondo a autoridade magisterial da Igreja, faz-se necessário criar espaços formativos e de debates que ofereçam e possibilitem uma melhor compreensão da boa comunicação no exercício da fé cristã.

* Platini Lennon Correia Santos é estudante de Teologia no Studium Theologicum Claretiano de Curitiba.

[1] CNBB, 2014, Apresentação.

[2] MARTINS, Nuno Brás da Silva. O estatuto teológico de uma teologia da comunicação. Didaskalia, 2003, p. 349.

[3] CNBB. Diretório de Comunicação da Igreja no Brasil. Documentos da NBB 99, Brasília: Edições CNBB, 2014, n. 35.

[4] Gn 2, 8-15.

[5] MARTINS, 2003, p. 354.

[6] ALBANO, 2016, p. 8.

[7] MARTINS, 2003, p. 356.

[8] CNBB. 2014, n. 43.

[9] Ibid. n. 44.

[10] PAULO VI, 1964, n. 10.

[11] Mt 28, 19-20.

[12] FRANCISCO. 2017.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBANO, Fernando. O mistério de Deus e o conhecimento: revelação e teologia sistemática. Faculdade REFIDIM, 2016.
BÍBLIA. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002.
CNBB. Diretório de Comunicação da Igreja no Brasil. Documentos da NBB 99, Brasília: Edições CNBB, 2014.
FRANCISCO. Mensagem por ocasião do 51º Dia Mundial das Comunicações Sociais: “Não tenhas medo, que Eu estou contigo” (Is 43, 5). 24 de janeiro de 2017.
MARTINS, Nuno Brás da Silva. O estatuto teológico de uma teologia da comunicação. Didaskalia, 2003.