Mais uma vez é Carnaval. A festa, o conjunto de festas que parece definir nosso país, o “País do Carnaval” no título irônico do livro de estreia de Jorge Amado, em que um personagem negativo critica o Brasil e os hábitos populares.

As festividades de sátira, inversão temporária de papeis sociais, uso de disfarces, consumo exagerado de bebidas e determinados alimentos, existem desde a antiguidade marcando geralmente o início da primavera e do plantio no hemisfério norte.

Essas festas incluíam comemorações entre os antigos egípcios, judeus, gregos e por fim romanos, e delas o Carnaval do cristianismo ocidental, quando a Igreja dentro do período da “Septuagésima” autorizava o afrouxamento de certas regras de comportamento antes do início da quaresma, em que jejum, mortificações e orações constantes eram obrigatórios. 

O Carnaval brasileiro deve ter se iniciado em Veneza com as mascaradas da “commedia dell’arte”, e em festas populares de Paris donde se espalharam por muitos lugares com destaque para as cidades de Nice, Nova Orleans, e finalmente Rio de Janeiro.

Desde o século dezenove o povo se divertia nas ruas do Rio, Salvador, Parati e outros locais com as “brincadeiras” do entrudo, que envolviam batalhas de água e outros líquidos, máscaras, danças, zombarias a autoridades, excesso de bebida alcoólica, e por fim brigas que podiam resultar até em mortes. Os privilegiados comemoravam em clubes e sociedades, e desfiles nos primeiros automóveis, os “corsos”.

Como quase tudo em nosso país, o Carnaval de rua tem duas vertentes:

_A praticamente semioficial, cujo expoente são as “Escolas de Samba”, imensas agremiações submetidas a regras draconianas de desfile, composição de Alas, tempo na Avenida, temas definidos e muitas vezes ridiculamente referentes a acontecimentos históricos nebulosos que resultam em fantasias mais próprias à corte de Luís XIV, músicas tema repetitivas; e o pior: carros alegóricos a cada ano mais portentosos e “camarotes VIP”, algo adequado à TV mas nunca um evento popular.

_O Carnaval em essência, representado principalmente pelos “blocos”, mais livres, com nomes provocativos como: Nunca mais eu bebo ontem, New Kids on the Bloco, Suvaco do Cristo, Toalha da Saudade, Siri com Tódi, Ritaleena, Antes aqui que na UTI, Simpatia é quase amor, e o bloco curitibano que deixou saudades Banda Polaca, a Zombie Walk também de Curitiba, além dos litorâneos Guaratubanda, Caiobanda e Matinbanda.

O acesso é praticamente aberto a todos, as regras são poucas e pautadas no bom senso e na busca de um comportamento nem sempre respeitado. Com os Trios Elétricos baianos, algo formalizados hoje em dia, mas ainda abertos às “pipocas”, o frevo de rua e todas as manifestações de festa e ritmo nacionais autênticos; e o mais divertido, blocos de rua, bandas, cordões, foliões solitários, que existem em todo o país, de Manaus a Antonina, de Salvador a Pirapora, e no Rio, sempre no Rio.  

Desde sempre se procurou censurar o “que não tem censura e nunca terá”, a prática de um moralismo tacanho que, a pretexto de preservar moral e bons costumes, tenta controlar a diversão  popular, como se desejassem implantar uma eterna quaresma, com jejuns e cilícios, com sacrifícios desnecessários. Há, claro, um limite que deve ser respeitado até em comportamento carnavalesco, seja em vestuário, música e danças, mas este limite não pode ser estabelecido no século dezenove.

Crianças e jovens amam o carnaval e suas brincadeiras, o tema é utilizado com sucesso em trabalhos escolares, mantendo tradições e o espírito festivo.

A seriedade se compõe também de senso de humor e leveza de espírito, é importante que saibamos disso, principalmente em tempos tão ameaçadores a paz mundial e à nossa paz de espírito.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.