José Cruz/Agência Brasil – Congresso: sem transparência

Depois de o governo dividir verbas públicas entre aliados por meio do orçamento secreto, sem critérios mínimos de transparência, parlamentares de vários partidos têm utilizado outra modalidade controversa de repasses – também criada no governo de Jair Bolsonaro – para enviar dinheiro a prefeituras e governos estaduais. Trata-se de uma espécie de “cheque em branco”, pelo qual deputados e senadores transferem recursos, desta vez de emendas individuais, sem que os beneficiários justifiquem ou apresentem projeto para mostrar onde o valor será aplicado.

Por esta modalidade, basta a prefeitos e governadores indicarem uma conta bancária para receber o dinheiro. Os Estados que receberam mais recursos, considerando governos estaduais e municipais, foram Minas, Paraná, São Paulo, Bahia e Ceará. Com as indicações, 2.759 municípios do País serão contemplados com essa modalidade de transferência. Para analistas, esse tipo de emenda pode aumentar a corrupção e estimular o mau uso do dinheiro público.

Neste ano, 393 parlamentares utilizaram a chamada transferência especial para enviar R$ 1,9 bilhão em emendas a Estados e municípios, de um total de 513 deputados e 81 senadores. No orçamento de 2020, 137 deputados e senadores lançaram mão das transferências para repassar R$ 621 milhões, valor que mais que triplicou neste ano. Os dados foram compilados pelo Instituto Nacional de Orçamento Público (Inopp.

Pix orçamentário

Apelidadas de “emenda cheque em branco” e de “Pix orçamentário”, pela facilidade com que o dinheiro chega aos beneficiários, as transferências especiais foram criadas em 2019, com a aprovação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC). Esse tipo de repasse transfere recursos de emenda individual, a qual cada parlamentar tem direito, mas de forma “menos burocrática”. A ideia era criar uma maneira mais rápida de fazer as verbas chegarem à ponta, para situações excepcionais. A exceção, no entanto, tem virado regra.

Neste tipo de emenda, o repasse do recurso é feito diretamente para o caixa de governos estaduais e municipais, pulando etapas necessárias para outros tipos de direcionamento de verbas pelos parlamentares, como a verificação técnica de contratos entre prefeitura e governo federal e a prestação de contas para órgãos como Tribunal de Contas da União (TCU) e Caixa Econômica Federal.

A fiscalização cabe a procuradores e tribunais de contas locais, mas há dúvidas sobre a efetividade do pente-fino, já que prefeito e governador não são obrigados a dizer onde gastará a verba. “A transferência especial não tem objeto definido para utilização”, disse o diretor do Inop, Renatho Melo.