SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma das grandes tendências da moda nos últimos três anos é a interseção dos armários masculino e feminino, a dita moda sem gênero. Mas Milão, a capital do sexy de butique, começou sua temporada de verão 2019, na terça-feira (19), dizendo ao mundo que a moda para as mulheres ainda é terreno mais prolífico do que as formas simples dessa corrente “genderless”.

Uma ode à feminilidade do passado com viés urbano encheu a passarela da grife Alberta Ferretti. Parcas gigantes e jaquetas jeans de cores doces, do azul bebê ao rosa claro que já domina as apostas da estação, misturaram-se com vestidos de renda, camisas rendadas e babados posicionados pelos punhos e colos.

A estética da lingerie, uma aposta que já dura um ano nas passarelas, permanece em blusas finas acetinadas como contraponto aos itens mais pesados, a exemplo das calças cargo amarradas com laço na cintura.

Quase como um militar romântico, peças cáqui permearam o desfile da marca, que criou um ideal de sensualidade urbana, repleta de transparências e roupas versáteis para o dia dia.

Por mais doces que possam parecer as propostas desse início de temporada milanesa, há uma tentativa de desestabilizar a imagem inocente do romantismo fashion.

Etiqueta querida entre mulheres de meia-idade, a Max Mara oferece um conceito de amazona moderna, com variações de trench coats e peças preenchidas por poás que, combinadas, transmitem uma imagem contemporânea do glamour aristocrático.

Camisas de tons sóbrios, do oliva ao marinho, são costuradas com as laterais plissadas. Vestidos soltos com tronco forrado por esses mesmos detalhes plissados parecem saídos do guarda-roupa formal de um homem do período romântico. Bermudas na altura dos joelhos sobrepostas a meias ajudam a criar essa impressão de look do universo masculino antigo.

Segundo a marca, é uma resposta à visão “machocêntrica” que muitas mulheres tiveram de assumir para se posicionarem como seres pensantes.

Assim, a Max Mara dá verniz masculino à roupa feminina, e não cai na mesmice do oposto, que é a feminilização da roupa dos homens como a maioria das marcas de visual clássico prefere fazer.

Se há neste início de temporada um claro sentido de libertação das ideias do que seria roupa de homem e roupa de mulher, a moda fica mais livre para repensar os clássicos do guarda-roupa sem se ater a estereótipos.

É o caso da Fendi, que no início da tarde desta quinta-feira apostou em uma moda mais cosmopolita do que a vista em temporadas anteriores, mais utilitária, embora ainda focada na imagem de glamour urbano.

Inspirados numa “selva”, só que de concreto, Silvia Fendi e Karl Lagerfeld, que assinam juntos a coleção, criaram jaquetas de couro longas e cheias de bolsos cuja cintura, marcada por cinto, transforma a peça em um vestido.

As peças têm vários furos como as da roupa esportiva, feita para respirar. A trilha sonora do desfile seguiu esse passo, começando com sons de respiração ofegante de alguém que, para correr em meio ao caos, precisa do conforto de peças versáteis.

O ruído evoluiu para a música “Black Snow”, do produtor Oneohtrix Pointer Never, que fala sobre uma “neve negra chegando”, um estado de caos onde não há harmonia.

Como se imaginassem um armário para tempos sombrios, a dupla de estilistas cria capas de chuva transparentes com costura de couro, um look que já foi cantado nas passarelas parisienses do ano passado.

Todo acabamento remete a essa ideia de reforço dos tecidos. O jeans, por exemplo, ganha camadas drapeadas dos lados, como escudos anti-imapcto. É como uma versão do look safári, modernizado para a selva de pedra das cidades.

Todas as roupas respiram e deixam o ar entrar, mesmo os casacos esportivos de pele de visom, camadas finas de selvageria típica de uma marca cuja fama e as críticas saíram do fato de ela deter as peles mais exclusivas e caras do mundo.

Assim como em outros desfiles desta temporada internacional de verão, o viés romântico também aparece na Fendi, no segundo bloco de ideias embaladas pela música “The Ballad of Lucy Jordan”, de Marianne Faithfull.

Respondendo à letra que sugere à mulher, presa em suas obrigações familiares, extravasar, como “correr nua pela sombra da rua, gritando pelo caminho”, a marca criou vestidos transparentes bordados com flores e conjuntos estampados com aves para traduzir esse espírito de libertação do recato e das boas maneiras.

Aqui vale o ditado de que “existe um mundo melhor (e inclusivo), mas ele é caríssimo”.