Até meados da década de 1980 o Brasil seguiu o modelo de forte intervenção estatal direta, tanto na prestação de serviços públicos quanto na atuação das atividades econômicas de forma geral. No entanto, com o final do governo militar e fortalecimento dos movimentos sociais pela melhoria das condições de vida, as estruturas estatais sofreram profundas mudanças que se refletiram na organização administrativa brasileira.

Tentando inserir-se dentro do padrão neoliberal, houve a adoção de um programa de redução do papel do Estado na exploração de atividades econômicas e prestação direta de serviços públicos, com as decisões governamentais seguindo as premissas da Constituição Federal de 1988, de que o Estado atuaria nas atividades econômicas monopolizadas (indústria do petróleo e gás); nos casos de segurança nacional e de relevante interesse coletivo.

No entanto, sempre ficou claro que embora a livre-iniciativa fosse definida como um dos pilares dessa nova etapa, o eixo principal ainda seria a dignidade da pessoa humana, e isso pressupõe o Estado exercendo a função regulatória, ou seja, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

A regulação é essencial ao Estado eficiente, seja em sua própria atuação, seja na sociedade e no mercado econômico em particular. A regulação econômica é considerada indispensável para ordenar as relações de mercado, corrigindo falhas e prevenindo situações de desordem que possam provocar crises, muitas vezes difíceis de sanar, sejam elas de caráter técnico ou político.

Um bom exemplo atinge artistas: presteza na regulamentação da lei de direitos autorais e na repressão ao comércio ilegal de músicas e outras manifestações culturais. O ordenamento geral deve guiar as organizações da cultura e melhorar o relacionamento dos gestores políticos com parte expressiva da comunidade dos artistas; de forma um pouco mais grave, outro exemplo está nas comunidades indígenas que necessitam sempre repressão governamental ao garimpo ilegal, das tentativas de grilagem e atentados às suas vidas e saúde. A situação dos indígenas exige, mais do que nunca, a presença reguladora estatal, sob pena de um genocídio.

O Estado não deve omitir-se dessas funções, já que a ele cabe restritamente o uso da força, infelizmente muitas vezes essencial na proteção de minorias, de mulheres e crianças em situações de vulnerabilidade. Embora não caibam medidas draconianas, o abandono puro e simples da fiscalização, deixando os diversos grupos de interesse agirem à vontade sem o menor controle, resulta em tragédias como vimos recentemente em Brumadinho. Ou alguém acredita realmente que mineradoras riquíssimas e poderosas são coibidas em suas práticas predatórias e descuidadas com o meio ambiente e a própria vida das pessoas?

No ensino este avanço em direção à modernidade também exige a presença do Estado moderando a dinâmica do mercado e as exigências de qualidade, sem a qual não atingiremos, em muitas e variadas dimensões, o pleno desenvolvimento cultural e econômico. Bom ensino exige investimento, tanto na formação de bons professores quanto em equipamentos e recursos como laboratórios, livros, softwares, ambientes seguros e confortáveis.

Sem supervisão adequada, realizada por especialistas que entendam as necessidades e como solucioná-las, a lógica do lucro vai prevalecer, e o simples marketing substituirá as metodologias adequadas. O discurso da escola excelente substituirá todas as boas práticas que efetivariam a narrativa como realidade, em tempos de fake news estamos cada vez mais apenas discorrendo – e lendo e ouvindo no WhatsApp – sobre teorias fantasiosas, fatos mistificados, expressões de vontades desconectadas da verdade, ou simples ficções.

Aparentemente perdemos a capacidade de discernir o real do mágico, estamos dispostos a aceitar qualquer prestidigitador que nos prometa felicidade e apenas diga o que queremos ouvir, relatos que confirmem que tudo vai bem, estamos no melhor dos mundos.

Faltando com a verdade será impossível atingir um bom ensino, e sem este, o desenvolvimento social e econômico  indispensável.

 

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.