Talvez não sejamos cordiais, mas certamente somos bem humorados. Os recentes Jogos Olímpicos o demonstraram: zombamos dos adversários, zombamos de nós mesmos, à falta de boxeador brasileiro no ringue torcemos pelo juiz brasileiro. Não deixamos passar nenhuma oportunidade de rir e de fazer piadas, o que não nos caracteriza como irresponsáveis, e sim como um povo que não se deixa abater, punimos os responsáveis pelo sofrimento e pelas injustiças com o ridículo.

Nenhum dirigente, político, poderoso, escapou ou escapa do julgamento das esquinas, dos bares. Um dos pioneiros do jornalismo satírico brasileiro, Apparício Torelly, o Barão de Itararé, após ter seu jornal empastelado por inimigos, várias vezes, afixou na porta uma placa em que constava entre sem bater, deixando claro a todos que não se referia à porta. O jornal O Pasquim foi perseguido e censurado pela ditadura militar, seus editores foram presos, mas nunca se renderam, nunca perderam o humor.

Fala-se que Curitiba seria uma cidade fechada, mas o humor brasileiro lhe deve alguns de seus melhores expoentes, o grande ator e diretor Ary Fontoura, a maravilhosa Odelair Rodrigues, o comediante Marcelo Madureira e muitos outros.

O poeta parnasiano Emílio de Menezes levou ao extremo a veia satírica: eleito para a Academia Brasileira de Letras deveria, conforme a tradição acadêmica, louvar o seu antecessor no discurso de posse; apresentou ao invés disso um texto repleto de críticas e ironias consideradas pela Mesa Diretora como aberrantes das praxes acadêmicas, e foi impedido de pronuncia-lo. Segundo a ABL, Emílio não aceitou mudar sua versão por quatro anos, vindo a falecer sem se tornar imortal (um truísmo que o agradaria).

Mesmo no sisudo Paraná dos anos 1930, quando o também sisudo interventor Manoel Ribas realizou um corte no número de funcionários públicos, não escapou do apelido Maneco Facão. Louve-se o bom humor de quem, derrotado em eleições, declarou: Aos vencedores, as batatas. Que as plantem. Mandar o desafeto plantar batatas é certamente muito mais saudável do que desejar matá-lo.

O humor sempre foi controvertido, vários autores clássicos tiveram óbices a ele. Platão havia declarado que o homem é um bípede implume, ao que seu rival Diógenes apresentou a seus discípulos um frango que havia depenado, nominando-o como o homem segundo Platão. Esta blague intensificou uma antipatia que o grande filósofo já nutria pelos cínicos e comediantes, é conhecida a crítica que faz na República a pensadores criativos, supostamente sem base. Contribuiu para isso a acusação a Sócrates feita por Aristófanes, o pai da comédia antiga, em sua peça As nuvens, quando apresentou o filósofo como sofista e pervertedor da sociedade ateniense.

Ainda dentro da espécie galinácea, foi Aristóteles que lançou uma indagação perturbadora, mas que tem seu aspecto cômico: quem veio primeiro, o ovo ou a galinha? Não se sabe a resposta, mas a pergunta desperta curiosidade sobre a origem das espécies, tema desenvolvido por Darwin, e que suscita comentários jocosos sobre nossos antepassados símios.

A leveza de espírito, em contraponto à dureza e à leviandade, é essencial, ajuda a ter saúde e amigos, melhora todos os aspectos da vida, que é séria, às vezes dolorosa, mas também é bela e nos dá oportunidades para rir, não as desperdicemos.

Como em todos os agrupamentos humanos, nas escolas o bom humor e suas manifestações são presentes e protagonizam algumas das melhores cenas de seu folclore e história. Vão desde situações verdadeiramente engraçadas até o pior do humor ferino, destrutivo e de mau gosto. Cabe aos professores, funcionários e aos próprios alunos o estabelecimento dos limites necessários à manutenção do respeito entre todos e ao processo de ensino e aprendizagem.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.