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A leitura do texto-base da Carta Apostólica Savifici Doloris, escrita em 1984 pelo Papa João Paulo II parece ainda atual nos dias de hoje, afinal, nos ajuda a compreender que a vida, desde sempre, é motivo de defesa e preocupação por parte da Igreja. Sendo ela um Dom de Deus, necessita ser resguardada, valorizada, defendida – até o dia do encontro final de cada um de nós com Aquele que a presenteou.

E é justamente sobre a atitude do homem diante do sofrimento que esta carta incorre. Ao longo de suas páginas, demonstra que estar diante do sofrimento do outro remete a nós mesmos a necessidade de empatia, de perceber a dor do outro. Para Wojtyla, o permitir-se sensibilizar é um ato essencial para quem está diante de um enfermo ou de alguém que está vivendo uma etapa crucial em sua vida, especialmente após a constatação de uma doença terminal ou diante da iminência da morte. 

Como sugestão, o papa comenta sobre a importância de se estar próximo a uma pessoa que sofre, visitar um doente mesmo em meio ao frenesi do quotidiano, que parece nos engolir com a rotina e nos deixa mais preocupados conosco próprios, com compromissos pessoais e, enfim, nos faz cair numa espiral de uma atitude um tanto quanto “egoísta” de não nos dar tempo para dividir um pouco de nós com quem sofre.

Para o papa, no contato com quem sofre, é importante analisar quais são suas necessidades físicas e espirituais… Por muitas vezes a pessoa pode até já apresentar uma atitude positiva diante da dor, que para si é redentora (termo expressado na Carta). É considerável constatar que há quem consiga ter clareza que pela dor se vive um momento de provação (assim como Jó), mas que mesmo diante dessa provação, consegue manter a fé inabalável em Deus (como Jesus). Nesse contexto, o que de melhor se teria a fazer é reforçar a esperança, apontada como caminho certo em momentos em que a ciência se demonstra limitada diante de questões de saúde delicadas.

Ao longo do texto, o Papa da Esperança descreve a importância de se dar conforto e certeza ao enfermo. É atitude cristã lhe dar companhia para que não se sinta sozinho nesta jornada – que todos nós, seres humanos, de alguma maneira passaremos, de diversas formas, em alguma etapa da vida. Mesmo que cada um a viva de um modo diferente, uma coisa é certa: a dor pode ser trampolim em meio a um obstáculo, podendo ser instrumento de purificação.

A Carta ainda revela a situação da dor ganha uma tonalidade mais cinzenta quando a pessoa que sofre encontra-se num momento de desânimo, desespero e, principalmente, quando não se devota a nenhuma crença ou ato de fé. Novamente, o essencial é sentir o outro, o que está gerando este estado de espírito. A razão destes sentimentos pode ser multifacetada, como as limitações em não poder sair do seu leito ou, talvez, porque se sinta abandonada por pessoas que esperava que estivessem mais presentes ou, também quem sabe, por talvez nunca ter imaginado que vivieria uma situação como a que está vivendo. 

Ao longo da vida, qualquer ser humano, independente de sua fé, terá algum tipo de experimento de sofrimento. Aliás, a fé de maneira alguma impedirá que tenhamos instantes curtos ou prolongados de dor e de sofrimento. Contudo, a fé pode minimizar sua potência, ajudando a enfrentá-los. No entanto, este estado humano pode ser sentido de forma laica e conversado como tal. A sensibilização independerá de outra pessoa acreditar ou não em algo, no entanto a quantidade de recursos que a própria pessoa tem para lidar com o processo favorecerá a conversa. Cada situação vivida por uma pessoa em momentos de limitação física e/ou emocional é muito particular, sendo cada qual tem respostas diferentes às situações de dor e sofrimento que passa.

Dessa forma, creio que as palavras de João Paulo II demonstram grande sensibilidade, atenção e delicadeza ao falar sobre a dor, sobre a morte e sobre o sofrimento humano, ajudando-nos a romper contra a corrente de um mundo que muitas vezes nos demonstra que precisamos fugir da dor, que é necessário a todo custo evitá-la ou mesmo a adotar uma forma de vida artificial, mecânica, que favoreça uma sobrevivência acima da lei de Deus ou mesmo a descontinuidade da vida por não encontrar sentido em vivê-la e entender que é necessária abreviá-la para fugir da dor e do sofrimento. 

Portanto, a partir da leitura deste texto-base para compreender um pouco mais sobre a importância da bioética e dos cuidados paliativos a alguém que sofre. A a dor em qualquer situação da vida, em especial em seu término é inevitável para todos nós, mas que o sofrimento é opcional. Ele pode ganhar tonalidades diferentes se formos capazes de compreender que nos proporciona a possibilidade de experimentar o consolo de Deus e nos unir à sua cruz, de oferecer estes momentos de escuridão por aqueles que estão ao nosso redor e que necessitam de Graças e ânimo; mas, sobretudo, a nos preparar para o encontro final com Deus.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

JOÃO PAULO II. Salvifici doloris: carta apostólica. 2. ed. São Paulo: Paulinas, 1984.