Henry Milleo – Servidores nas galerias do plenário da Assembleia

As licenças-prêmio concedidas a servidores públicos estatutários estão no centro do debate com o governo do Paraná no período que antecede a data-base do funcionalismo. No início do mês, o secretário-chefe da Casa Civil, Guto Silva (PSD), chegou a confirmar que estava em estudo oferecer aos servidores uma troca: fim das licenças-prêmio por retomada de reajustes anuais nos salários.

A folha dos servidores está congelada há três anos, sem nem recomposição da inflação, com defasagem de 16% de perda desde a decisão do então governador Beto Richa (PSDB) em 2016 que suspendeu o direito.

O atual governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) confirmou que o fim das licenças-prêmio está em discussão, mas que nenhuma proposta concreta foi colocada aos sindicatos. “Nós estamos avaliando”, disse. A data-base dos servidores do Paraná é dia 1º de maio.

De acordo com Hussein Bakri (PSD), líder do governo na Assembleia, o governo não sabe se proporá o fim das licenças, mas se fizer terá de ser dentro de um pacote que ofereça ganhos para os trabalhadores. “Não vai ser um pacote de maldades, terá que haver compensações”, afirma Bakri. O deputado afirma que a opinião pública poderia vitaminar a proposta de acabar com as licenças.

Deputados da base do governo consideram que a sociedade organizada poderia ser favorável, por supostamente ser vista como um “privilégio”. Por lei, apenas servidores da administração direta e das autarquias, submetidos ao regime estatutário, e os militares têm direito, como prêmio de assiduidade, a 90 dias de licença em cada período de cinco anos de exercício, desde que não tenham sofrido qualquer penalidade administrativa. Quando o servidor recusa o direito, o Estado precisa pagar o equivalente em dinheiro. Esse é o principal ponto em discussão, já que o argumento do governador é ausência de caixa para manter pagamentos de todos os benefícios.

O debate não é exclusividade do Paraná. Na última quarta-feira (17), o governo do Mato Grosso publicou um decreto que estabeleceu novas diretrizes para a concessão de licença-prêmio aos servidores civis e militares do Poder Executivo. Entre as medidas adotadas estão a proibição de acúmulo de períodos aquisitivos e de eventuais passivos decorrentes do desligamento do servidor por meio de exonerações ou aposentadorias.

De acordo com aquele governo, as regras foram endurecidas devido ao fato de alguns servidores estarem acumulando o benefício, o que geraria passivos ao Estado no momento da aposentadoria. Conforme o decreto, a licença-prêmio deverá ser usufruída dentro do período aquisitivo seguinte ao período de direito, não podendo o servidor acumular duas licenças. Ela deverá ser tirada integralmente ou parcelada em até três períodos de no mínimo 30 dias.

No Rio Grande do Sul, deputados aprovaram em março a proposta que acaba com as licenças-prêmio e cria em contra-partida a Licença Capacitação. Com isso, a cada cinco anos de efetivo exercício, o servidor terá direito a uma licença de até três meses, para participar de curso de capacitação profissional que guarde pertinência com seu cargo ou função, mantida a respectiva remuneração e sem prejuízo de sua situação funcional.

A proposta paranaense em estudo seria mais radical. Acabaria de vez com o direito. Poderiam ser mantidos apenas àquelas que já adquiriram o benefício. Até agora, essa foi a única saída ventilada pelo governo do Paraná para que haja reajuste. Mesmo assim, Ratinho Junior adiantou que “não neste ano”. “Tudo é estudo. Não queremos, neste momento, tirar direito, nada disso. Estamos buscando soluções para engordar o caixa do governo e consertar qualquer tipo de distorção que possa haver entre o público e o privado”, disse.

Benefício compensa direitos

O benefício da licença-prêmio foi criado em uma forma de compensação aos servidores do regime estatutário em razão da ausência de fundo de garantia, participação nos lucros, entre outros bônus previstos em regimes de trabalho distintos. Os estatutários têm estabilidade e não usufruem dos benefícios concedidos a trabalhadores celetistas (em regime de Consolidação das Leis do Trabalho). Desde 2011, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) pacificou que servidores públicos celetistas também não tem o direito, justamente por usufruir de outros. Para o TST, os servidores celetistas e estatutários não possuem os mesmos direitos, pois pertencem a regimes jurídicos distintos e, no caso específico dos autos, não há norma legal que contemple as autoras da ação com igual direito.

Sindicatos de servidores alegam que uma eventual proposta de fim da licença-prêmio fere o princípio da isonomia, previsto como cláusula pétrea da Constituição Federal. Quando aplicasse a medida apenas a novos servidores criasse uma classe inferior de servidores ativos que, “apesar de serem vinculados à Administração pelo mesmo regime jurídico estatutário, possuiriam direitos reduzidos em relação aos demais”. O parecer foi emitido pela Procuradoria Jurídica da Câmara de Curitiba em projeto semelhante que tramitou referente a servidores municipais da capita.

A Projuris relembra ainda que a tentativa de acabar com a licença-prêmio dos novos servidores já foi rejeitada pela Câmara Municipal no ano passado, quando a intenção foi retirada do pacote de ajuste fiscal.

Sindicatos relembram que existem diferenças nos direitos garantidos aos trabalhadores do setor produtivo, como por exemplo a existência do fundo de garantia e o direito à participação nos lucros e resultados. Entretanto, essas diferenças não podem ser entendidas como benesses ou privilégios de um setor em relação a outro. A licença-prêmio se trata de uma política de valorização do servidor e um incentivo para atrair novos profissionais e incentivar a permanência na carreira.

Segundo sindicatos, entre os impactos de um eventual corte da licença-prêmio seria na qualidade dos serviços públicos. A prática poderia desvalorizar e desmotivar os servidores e colocara em xeque o “princípio da eficiência invocado na justificativa e tão pouco preza pela qualidade e presteza no atendimento do serviço público”.